Quase meio milhão de aposentados buscam Correios para contestar descontos indevidos em benefícios
Em apenas duas semanas desde o início do atendimento presencial, mais de 488 mil aposentados e pensionistas procuraram as agências dos Correios em todo o Brasil para contestar descontos considerados irregulares em seus benefícios. A iniciativa, disponível desde 30 de maio, visa facilitar o acesso à contestação para aqueles que têm dificuldade em utilizar canais digitais como o aplicativo Meu INSS e a Central 135.
“É um número bem significativo, porque em apenas duas semanas funcionando, a gente já tem mais de 10% do total de requerimentos via Correios. É um atendimento humanizado, olho no olho, presencial, um atendimento em que a pessoa se sente segura”, afirmou o presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Gilberto Waller, durante visita à agência central dos Correios em São Paulo nesta sexta-feira (13).
A medida foi bem recebida por beneficiários como Maria Alves de Oliveira, de 83 anos, aposentada há mais de três décadas, que não tem acesso à internet. “Eu vim aqui só para ver se teve desconto. Não percebi [desconto na aposentadoria], mas para desencargo de consciência, eu vim pegar pãozinho [em uma igreja próxima] por causa do dia de Santo Antônio e aproveitei para passar nos Correios. Mas isso tudo é muito desumano. Esse país está podre. O ladrão roubando da gente que ganha apenas um salário mínimo. Isso é duro”, desabafou.
A partir da próxima segunda-feira (16), os aposentados e pensionistas que tiveram descontos indevidos e que já buscaram os canais de atendimento há mais de 15 dias úteis poderão retornar às agências dos Correios para verificar as respostas das entidades sobre seus descontos.
Milhões de contestações e projeções de prejuízo
Até o momento, foram registradas mais de 3,1 milhões de contestações, ou seja, mais de 3 milhões de pessoas alegaram não ter autorizado os descontos de associações em seus benefícios. “Esse é um marco muito próximo daquele projetado pela CGU [Controladoria-Geral da União] e pela Polícia Federal de 4,1 milhões de pessoas”, destacou Waller.
Desse total de contestações, 512 mil já foram respondidas pelas instituições, que apresentaram documentos comprovando a autorização dos descontos e a ausência de fraude. Além disso, as entidades alegam que 100 mil contestações já foram resolvidas judicialmente. Os demais casos continuam em apuração ou aguardam resposta das associações.
“Hoje temos 512 mil contestações das instituições em que elas informaram que houve o vínculo, que teve o desconto e autorização para isso. Isso é juntado dentro do sistema. Para quem utiliza o aplicativo Meu INSS, essa resposta já está disponível para fazer a consulta pelo aplicativo, em que você consegue verificar se aquele documento foi feito por você mesmo, se você assinou [a autorização para o desconto]”, explicou o presidente do órgão.
Embora o tamanho exato da fraude ainda não possa ser previsto, o presidente do INSS estima que, se todas as 3,1 milhões de contestações forem confirmadas como irregulares, o dano pode chegar a cerca de R$ 1,8 bilhão, sem correção monetária. Com correção, o valor poderia alcançar R$ 2,12 bilhões. “Esse é um valor bem importante para a gente porque, quando se levantou a fraude, pensava-se em um prejuízo na monta de R$ 6,7 bilhões ou até R$ 9 bilhões”, ressaltou.
Waller explicou que grande parte das fraudes envolve instituições “fantasma” criadas em 2020 ou 2021, que efetuaram descontos por apenas dois anos, em vez dos cinco anos esperados. Além disso, o valor médio dos descontos era inferior (abaixo de R$ 48 por beneficiário), “talvez até para não chamar muita atenção do nosso beneficiário”.
O presidente do INSS não forneceu uma estimativa de prazos para o ressarcimento dos beneficiários, mas garantiu que o governo busca agilizar o processo, utilizando o bloqueio de bens dos fraudadores. “Desde o início, a ideia é que esse dinheiro saia do bolso de quem roubou, de quem fraudou, de quem lesou os nossos aposentados e pensionistas. Ingressamos rápido com o processo de responsabilização de pessoa jurídica e conseguimos o bloqueio de R$ 2,8 bilhões para assegurar o ressarcimento”.
Como buscar o atendimento
Aqueles que já realizaram a contestação por meio do aplicativo Meu INSS, site do INSS ou Central 135 não precisam procurar os Correios.
No estado de São Paulo, 634 agências dos Correios estão habilitadas para atender os beneficiários, e em todo o país, são mais de 5 mil agências em funcionamento. A fraude foi descoberta em abril deste ano, durante a Operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal, que investiga um esquema envolvendo associações e sindicatos que aplicavam descontos indevidos. Cifras iniciais da PF estimavam que R$ 6,3 bilhões em descontos associativos foram realizados entre 2019 e 2024.
Para buscar informações e contestar descontos nos Correios, o segurado deve apresentar apenas um documento oficial de identificação com foto. Em casos onde o beneficiário não pode comparecer, um representante legal com procuração autenticada pode ser nomeado, válida apenas para consulta. O atendimento é gratuito.
“Esse atendimento é muito fácil e ágil. Basta o aposentado ou a aposentada apresentar para o atendente um documento com foto. Nesse atendimento vai ser identificado se houve o débito não autorizado ou não. No caso de se constatar o débito, o aposentado ou aposentada, nesse mesmo momento, já pode fazer a contestação no próprio atendimento. Isso vai gerar um protocolo e depois de 15 dias úteis (cerca de três semanas) ele pode retornar para saber qual é a informação que foi repassada para o INSS”, explicou Vinícius Moreno, superintendente estadual dos Correios São Paulo Metropolitana.
Moreno informou que a Agência Central dos Correios na capital paulista já realizou quase mil atendimentos, e em todo o estado de São Paulo, cerca de 50 mil pessoas buscaram o serviço. Os Correios reforçam que nenhum funcionário do INSS ou dos Correios está autorizado a ir até a casa dos beneficiários para oferecer esse serviço, que é feito exclusivamente nos canais oficiais. Com informações da Agência Brasil