Exclusão invisível: 1 em cada 5 moradores de favelas vive em vias sem acesso a veículos
Novo estudo do Censo 2022, divulgado pelo IBGE, revela que 3,1 milhões de pessoas em comunidades urbanas residem em ruas restritas a pedestres, impedindo a chegada de serviços essenciais como lixo e ambulâncias.
Um novo recorte do Censo 2022, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), escancara a precariedade da infraestrutura viária nas comunidades. Segundo o suplemento Favelas e comunidades urbanas: características urbanísticas do entorno dos domicílios, cerca de 19,1% dos habitantes de favelas – o que corresponde a 3,1 milhões de pessoas – residem em vias que são inacessíveis para carros, caminhões e ônibus.
Essa limitação significa que serviços básicos como a coleta de lixo ou o acesso de veículos de emergência, como ambulâncias e caminhões de combate a incêndio, são impossíveis na porta de casa. Fora das favelas, essa restrição atinge apenas 1,4% da população.
Barreiras no acesso a serviços públicos
O levantamento, que considerou a população dos 656 municípios que possuem registro de favelas, mostra que apenas 62% dos moradores de comunidades habitam vias com capacidade para receber ônibus e caminhões. Em contraste, 93,4% das pessoas que moram fora de favelas residem em ruas que permitem a circulação de veículos de grande porte e de carga.
O chefe do Setor de Pesquisas Territoriais do IBGE, Filipe Borsani, destacou que para 38% dos moradores de favelas, a estrutura viária se transforma em um impeditivo para o acesso à cidadania.
“Isso significa a dificuldade de acesso a certos serviços públicos. Não passa um caminhão de lixo, por exemplo”, afirmou Borsani, sublinhando as consequências da exclusão.
O Censo já havia revelado que o Brasil tinha 16,4 milhões de habitantes em 12.348 favelas em 2022, residindo em 6,56 milhões de domicílios. O instituto considera como vias os becos, vielas, escadarias e palafitas, entre outros.
Calçadas e pavimentação também são deficientes
Outros indicadores urbanísticos reforçam a infraestrutura deficiente nas favelas em relação às demais áreas urbanas:
Calçadas: Fora das comunidades, 89,3% dos moradores tinham calçada na via. Nas favelas, essa proporção cai para 53,9%. O estudo ainda detalha que na Rocinha, a maior favela do país no Rio de Janeiro, apenas 12,1% dos moradores vivem em vias com calçadas.
Calçadas sem obstáculos: A acessibilidade é um problema ainda maior. Enquanto 22,3% dos moradores fora das favelas residiam em vias com calçadas sem obstáculos (facilmente transitáveis), nas favelas essa proporção despencava para apenas 3,8% (cerca de 611,4 mil pessoas). Na Rocinha, a situação era mais extrema, com apenas 0,1% dos moradores com calçadas sem barreiras.
Rampas para cadeirantes: A presença de rampas também é reduzida: 18,5% dos habitantes fora das favelas tinham rampas no entorno de casa, contra meros 2,4% nas favelas.
Pavimentação: O percentual de moradores de favelas com vias pavimentadas no entorno (considerando mais de 50% do trecho com alguma cobertura como asfalto ou paralelepípedo) era de 78,3%, enquanto fora das comunidades chegava a 91,8%. A pesquisa notou, contudo, que a Bahia é a única unidade da federação em que a pavimentação nas favelas (92,1%) supera a das áreas não-faveladas (89,7%), o que o analista Filipe Borsani sugere poder estar ligado à autoconstrução pela própria população.
Iluminação, o único avanço
A iluminação pública se destaca como a infraestrutura urbana mais disseminada nas favelas. Os recenseadores identificaram a existência de postes de luz (sem avaliar seu funcionamento) em 91,1% dos trechos de rua onde os moradores residem. Fora das favelas, o percentual é de 98,5%.
Contudo, mesmo neste indicador, há exceções: na Rocinha, a presença de ponto de luz no entorno do domicílio recuava para 54,3%.
Exclusão histórica e subsídio para reivindicações
Para os pesquisadores, os dados coletados revelam uma “exclusão histórica” das favelas, com o poder público investindo de forma desigual em equipamentos urbanos.
Leticia Giannella, gerente de Favelas e Comunidades Urbanas do IBGE, expressou a expectativa de que os dados da pesquisa sirvam de instrumento para a sociedade.
“Que sejam instrumentos para reivindicação por melhorias, tanto pelas populações e pelas organizações locais, que possam se apropriar efetivamente desses dados para poder reivindicar melhorias, para que deixe de ser uma oferta precária ou incompleta de serviços e equipamentos feitos pelo Estado”, concluiu. Com informações da Agência Brasil


