Estudo avalia técnica capaz de acelerar o crescimento do tambaqui
A Embrapa Pesca e Aquicultura (TO) estuda uma técnica capaz de deixar o tambaqui (Colossoma macropomum) aproximadamente 20% maior e mais pesado. A técnica consiste em gerar, por meio de aplicação de pressão nos ovos fertilizados, peixes com três conjuntos de cromossomos (triploides) – em condições naturais são dois conjuntos – para deixar o peixe infértil. Com isso, ele cresce e se engorda mais rápido do que em condições normais. A pesquisa faz parte da tese de doutorado de Aldessandro Costa do Amaral, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), sob orientação da pesquisadora Fernanda Loureiro de Almeida O´Sullivan .
Além do crescimento mais rápido, a esterilidade provocada pela técnica de produção de peixes triploides é uma vantagem para a propagação da piscicultura nativa. “Quando você tem um peixe estéril, abre a possibilidade de regularização de seu cultivo em uma região onde ele seja exótico”, ressalta um pesquisadora. Isso porque, em caso de fuga para a natureza, os animais estereis não oferecem risco de se reproduzirem em regiões das quais eles não fazem parte como, por exemplo, a Bacia do Prata, no Pantanal. “Assim, você expande os locais em que a espécie pode ser cultivada, mediante a regularização da atividade”, destaca o cientista.
A tecnologia já é empregada no exterior em peixes como salmão e truta, e o maior desafio era adaptá-la para o tambaqui, a segunda espécie mais produzida no Brasil. “Nas pisciculturas de truta na Escócia, o peixe cultivado tem que ser obrigatoriamente triploide, para não desovar. Como essas espécies são criadas em gaiolas no mar, precisam ser estereis para não se reproduzirem, ou que causem uma contaminação genética na população natural. Por isso é uma obrigação que todos os peixes sejam triploides”, explica a pesquisadora, acrescentando que a técnica em si não é nova; a novidade está na aplicação em peixes nativos brasileiros. “É uma tecnologia antiga, relativamente simples e de grande efeito na aquicultura, que estamos adaptando para o tambaqui.”
Equipamento importado
A pesquisa faz parte do projeto Aquavitae , o maior consórcio científico já realizado para estudar a aquicultura no Atlântico e no interior dos continentes banhados por esse oceano. Por meio do Aquavitae, a Embrapa utilizou de 2019 a 2023, para os primeiros testes dessa técnica, um equipamento de pressão próprio para a indução de poliploidia de cromossômica em peixes. A empresa norueguesa Nofima cedeu o equipamento para os experimentos na Embrapa Pesca e Aquicultura. Trata-se de aparelho de grande porte que funciona de forma automática, bastando regular a pressão e o tempo desejado. A máquina é inédita no Brasil. “O aparelho que mais se parece com a Universidade de Santa Catarina, porém, a aplicação da pressão é manual”, conta a pesquisadora.
Como é a técnica
O´Sullivan explica que a pesquisa buscou definir três parâmetros cruciais para induzir a triploidia. Primeiro, o tempo após a fecundação do ovo em que se deve iniciar o choque de pressão. Depois, foi preciso definir a intensidade da pressão a ser aplicada para o tambaqui, e, por fim, a equipe teve que descobrir a duração ideal da pressão. “Tivemos que identificar essas três configurações para o tambaqui ao longo do projeto”, explica o cientista.
Para realizar a técnica, são utilizados um milhão de ovos recém-fertilizados, que vão para a máquina de pressão. Em seguida ao choque de pressão, os ovos vão para as incubadoras comumente usadas e o manejo é igual à larvicultura tradicional e à alevinagem. A quantidade de ração também é a mesma por biomassa; apenas os peixes começam a crescer mais. A pesquisadora contou que o protocolo para obtenção de 100% de triploides levou cinco anos para ser alcançado, após vários testes-piloto.
Em seis meses, 20% maior
Durante uma pesquisa, que avaliou o ciclo de crescimento e engorda do tambaqui triploide durante seis meses, constatou-se que o peixe ficou 20% maior e mais pesado que os irmãos que não tinham passado pelo choque de pressão (usados como controle). O próximo passo da pesquisa é fazer uma avaliação durante o ciclo completo de crescimento da espécie, que dura 12 meses.
“Produzimos um novo lote de triploides que deixaremos crescer até chegarem a um quilo. Se o resultado para o mesmo que tivemos com o peixe de seis meses, eles chegarão a um quilo em menos de 12 meses”, calculou a pesquisadora, acrescentando que também estão sendo avaliadas a sobrevivência larval e a ocorrência de deformidades nesses peixes.
Outra característica que preocupa os pesquisadores são as consequências da triploidia no sistema imunológico dos peixes. Resultados preliminares indicam que o tambaqui triploide pode ter uma resistência reduzida a condições desafiadoras, como alteração da temperatura da água. Por isso, segundo a pesquisadora, antes que a tecnologia seja repassada para o setor produtivo, serão realizados para estudos a validação completa da técnica de produção de tambaquis triploides. “O primeiro passo foi conseguir obter um protocolo que nos desse 100% de triploidia em tambaqui. Comentários muito felizes e esperançosos de termos alcançados esse objetivo. Agora, outros estudos avaliarão as vantagens e possíveis dessa técnica na produção da espécie”, conclui Fernanda O’Sullivan.
Produção de tilápia usa outra técnica
Embora a infertilidade dos peixes seja uma vantagem para o crescimento do animal e para a expansão em novas regiões de produção, a triploidia não é indicada para a tilápia ( Oreochromis niloticus ), a espécie mais produzida no Brasil. Segundo um pesquisadora, há para a tilápia uma técnica mais econômica, que promove a criação do monosexo do macho pelo tratamento com hormônios para esse fim.
“A tilápia também tem protocolo de triploidia desde 1980, mas não está mais usando, pois fica mais barata fazer a masculinização pela ração”, ressalta O´Sullivan. Ao contrário do tambaqui, em que as fêmeas são maiores do que os machos, na tilápia, os machos é que são maiores. Assim, foram desenvolvidas técnicas para masculinizar as larvas da tilápia. Ainda assim, para se fazer a triploidia, os ovos devem ser fertilizados in vitro, ou seja, artificialmente. E a produção de larvas de tilápias hoje se baseia na reprodução natural dos casais e na coleta dos ovos já em desenvolvimento.
No caso da criação de monosexo da tilápia, quando os alevinos começam a comer, é oferecida ração com metiltestosterona. Isso faz com que todos os peixes se tornem machos. Com a produção exclusiva de machos, além de acelerar o crescimento, evita problemas de reprodução desenfreada da espécie, que é exclusiva no Brasil.
A pesquisadora ressalta que a técnica do monosexo nada tem a ver com a triploidia. “A técnica empregada no peixe triploide está ligada ao crescimento e à esterilidade. A esterilidade é muito importante, porque é uma característica que o monosexo não tem. Os peixes são do mesmo sexo, porém são férteis”. Ela conta que a Embrapa já está pesquisando produzir monosexo de tambaqui feminino, também pelo uso da ração – no caso, acrescida de estradiol. Com informações da Embrapa