Estudo cria protocolo de qualidade, rastreabilidade e indicação geográfica do pinhão

Estudos realizados pela Embrapa Florestas (PR) e parceiros resultaram no primeiro protocolo de qualidade e rastreabilidade do pinhão – semente comestível e nutritiva do pinheiro-do-paraná ou araucária (Araucaria angustifolia). Essa solução pavimenta o caminho para a criação do selo de Indicação Geográfica (IG) da espécie no Brasil, de forma a garantir mais qualidade aos consumidores. São diferenciais fornecidos pela pesquisa agropecuária para agregar valor a esse alimento regional, que tem crescido em importância no mercado nacional, com potencial de ascensão no mercado internacional.

O novo protocolo abrange as etapas da coleta ao consumo e representa um marco para o avanço da qualificação da cadeia produtiva em direção à maior valorização desse produto alimentício brasileiro de origem florestal, típica das regiões Sul e Sudeste.

Na mesma linha de fortalecimento da araucária como espécie potencialmente rentável, mantida em pé ou plantada, geradora de produto não madeireiro sustentável, destaca-se também o estudo preliminar sobre a criação de selos de Indicação Geográfica (IG) de pinhão com base nas características locais e nos atributos sensoriais.

O protocolo é o primeiro passo para a entrega de um pinhão classificado e com rastreabilidade no mercado. Duas cooperativas paranaenses já estão adotando o que é recomendado a partir de 2025, aplicando melhorias na coleta, separação, armazenamento e venda de semente ao natural. “Não será uma exigência, mas, certamente, à medida que produtores, técnicos e consumidores verificarem os resultados positivos das práticas recomendadas, a adoção do protocolo tenderá a ocorrer de forma espontânea”, explica a pesquisadora da Embrapa Florestas e uma das autoras do documento, Rossana Godoy.

Por ser uma primeira iniciativa, a equipe técnica ressalta que o protocolo poderá, ao longo do tempo, ter ajustes de acordo com a demanda dos atores envolvidos. “Importante agora é alavancar o primeiro passo”, destaca o pesquisador, lembrando que a padronização da oferta de pinhão no mercado consumidor paranaense deverá inspirar iniciativas semelhantes em outros estados produtores, como Santa Catarina, Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais. De acordo com os dados oficiais mais recentes disponibilizados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), faltou pouco para o valor da produção brasileira de pinhão em 2022 atingir R$ 52 milhões de reais (R$ 51.798 mi) com o total de 13.376 toneladas. Com a organização do mercado, a produção e o consumo tendem a se consolidar e expandir.

Por um caminho com qualidade técnica
O protocolo oferece orientações técnicas que interessam a todos os agentes envolvidos na produção e comercialização do pinhão, ao informar os pré-requisitos para que o caminho percorrido pela semente até os pontos de venda seja feito com qualidade. A coleta, transporte, beneficiamento, acondicionamento e armazenamento do pinhão são detalhados no protocolo, incluindo também recomendações para rotulagem e identificação de lotes, baseadas em normativa estadual. Além disso, o documento enfatiza a importância da rastreabilidade do produto, permitindo que os consumidores informem a origem e os dados da colheita do pinhão, garantindo, assim, seu estado de frescor e qualidade.

As pesquisas realizadas na Embrapa Florestas pela pesquisadora Rossana Godoy fundamentaram técnicas a elaboração do protocolo. Uma delas deu origem ao artigo “ Consumidor de pinhão: hábitos, atributos de importância e percepção ”, publicado pela revista Pesquisa Florestal Brasileira em 2018. Outra pesquisa realizada no estudo com consumidores de pinhão, intitulado “Estudo exploratório para identificação e separação de pinhões (Araucaria angustifolia) destinados ao consumo”, publicado pela Revista Agrária Acadêmica em 2022. Há também a publicação “ Alterações na composição físico-química de pinhões (Araucaria angustifolia) armazenada em diferentes embalagens e ambientes”, publicada pela Pesquisa Florestal Brasileira em 2023.

Mais qualidade e valorização do produto “pinhão”
Com base nesses estudos, a pesquisadora destaca a necessidade de melhorar distintos aspectos, visando oferecer um produto de maior qualidade aos consumidores. “O pinhão, por ser uma semente que perde muita umidade, logo após a pinha se abrir, tende a ter uma vida útil reduzida, necessitando de estratégias técnicas para estender seu período de consumo. Por isso, identificamos a necessidade urgente de melhorar a qualidade e rastreabilidade do pinhão comercializado”, afirma Godoy.

Ela reforça também a grande mistura de pinos provenientes de coletas distintas disponíveis no produto comercializado a granel. “Hoje em dia, é comum encontrar pinos de baixa qualidade misturados aos de boa procedência, o que acaba prejudicando a aceitação do produto. Não somente isso, mas também há desvalorização de uma matéria-prima que tem potencial para obter maior valor agregado. Com o protocolo, esperamos oferecer um guia claro e confiável tanto para o produtor quanto para o consumidor”, complementa a pesquisadora.

Segundo Nivaldo Guimarães Vasconcellos, engenheiro-agrônomo da Secretaria de Segurança Alimentar e Nutricional de Curitiba ( SMSAN ), o protocolo é um documento técnico relevante, que vai ajudar muito na estruturação e no desenvolvimento da cadeia produtiva do pinhão. “Com esse instrumento, as cooperativas junto com seus produtores poderão apresentar um produto de qualidade e com rastreabilidade garantida. É uma solução inovadora para um produto que é símbolo de nossa Região e esperamos que isso alavanque toda a cadeia produtiva, gere renda e desenvolvimento sustentável para os produtores”, afirma.

Rastreabilidade: de onde vem o pinhão?
A rastreabilidade é um processo que, por princípio, permite acompanhar todo o percurso de uma matéria-prima, desde a origem até ao consumo. No caso do pinhão rastreado, após a seleção das sementes aplica-se a prova de Schenkel, em que os pinhões são imersos na água na proporção de 3:1 (três porções de água para uma de pinhão). O teste mostra que as sementes que flutuam na superfície apresentam maior ataque de broca; as que ficam em equilíbrio ainda têm a possibilidade de serem atacadas e, as que afundam são aquelas com chances muito pequenas de serem atacadas. Depois, os pinhões devem ser bem secos e embalados, “geralmente, em redes plásticas reforçadas que são fechadas com lacre metálico” e rotulados segundo regras observadas na Resolução estadual nº 748 de 15/12/2014 e na Resolução RDC nº 259/2002 da Anvisa /EM . No rótulo da etiqueta deve constar qual é o produto, número do lote, identificação dos fornecedores, peso e, no caso de cooperativas, o CNPJ, dados de entrada e tratamento fitossanitário.

“A rastreabilidade é importante porque a durabilidade do pinhão está atrelada ao momento da colheita. A partir do momento em que se abre a pinha, o pinhão começa a perder a umidade, e fica com o aspecto envelhecido. Aquele pinhão que se compra na gôndola do mercado, a granel, ficou muito tempo exposto e vai ressecando. Pode até ser bom, mas o aspecto dele vai se perder”, explica Jonas Eduardo Bianchin, extensionista do Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná ( IDR ), e um dos autores do protocolo. Além de saber a origem do pinhão, o produtor saberá quando ele foi colhido e, portanto, quanto tempo, em média, deve durar com qualidade. “Após a colheita, o pinhão sadio mantém a sua qualidade por 10 dias no ambiente, em seguida deve ir para a refrigeração, onde ele suporta mais 20 dias, depois tem que ser congelado”, explica Godoy.

Alexandre Marra, supervisor do Sistema Faep/Senar-PR , ressalta a transparência e a confiança de que a rastreabilidade envolve o consumidor, da origem à mesa, como também a disponibilidade de um produto com qualidade superior à encontrada atualmente no mercado. “E para a sociedade em geral, também observamos benefícios, por estarmos alinhados com metas globais importantes, como alguns dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ( ODS ) da Organização das Nações Unidas ( ONU ), com foco na busca pela segurança alimentar, do consumo e produção sustentável, como também a prospecção de parcerias e integração público-privada para o desenvolvimento das cadeias produtivas de importância, não só aqui para a região metropolitana de Curitiba, mas também para todo o estado do Paraná”, acrescenta.

O “novo produto” adequadamente ao protocolo terá um maior valor agregado, por conferir maior qualidade à semente, e como consequência, poderá atender a clientes mais exigentes e preocupados com a procedência e tempo de colheita. “A adoção de práticas que primam pela oferta de produtos de melhor qualidade, naturalmente, promove mudanças impactantes na cadeia produtiva com consequente fidelização do consumidor”, aponta a pesquisadora da Embrapa.

Pioneiros na adoção
As primeiras cooperativas (unidades de consolidação) previstas para adotar as práticas recomendadas no protocolo são a Nascente (Campina Grande do Sul, PR) e a Provale (Rio Branco do Sul, PR) que, desde o início dos trabalhos do Grupo do Pinhão, vêm acompanhando as discussões. Segundo Fernanda Arcie, produtora e integrante da Diretoria-Executiva da Cooperativa Nascente, apesar de muitos agricultores já fazerem algum tipo de seleção dos melhores pinhões, destinados à merenda escolar do município de Campina Grande do Sul e à comercialização, o protocolo traz os critérios de como fazer o processo. “Pretendemos iniciar com as cestinhas adequadas e as etiquetas com rótulo contendo a nossa marca na safra do próximo ano. Essa iniciativa traz uma importância muito grande para o pinhão, pois hoje ele é comercializado de qualquer forma, sem critério nenhum e, às vezes, apresenta falhas, como a ausência da amêndoa. Com as novas exigências, é notável que poderemos aumentar a venda, oferecendo produtos de melhor qualidade para os consumidores, além de gerar mais renda maior para nós, produtores”, defende.

Segundo Bruno Guimarães, sócio-diretor Presidente da Cooperativa Provale, a adequação às diretrizes deve acontecer também em 2025. “A iniciativa é muito boa. Estamos nos organizando para que, no ano que vem, consigamos fazer a comercialização. No momento estamos em conversa com os produtores, buscando orientar os processos que atendem ao protocolo”, observa.

O documento, em formato de folder, foi desenvolvido pela Embrapa Florestas, em colaboração com diversos parceiros, incluindo: o Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR), Sistema Faep/Senar-PR, Secretaria Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional de Curitiba ( SMSAN) e instituições de ensino como o Instituto Federal do Paraná-Campus Colombo . A publicação resulta das iniciativas do Grupo de Trabalho Agro Alimentar do Pinhão (GT Pinhão), que foi instituída dentro do Pró Metropole – Programa de Desenvolvimento Integrado da região Metropolitana de Curitiba. O protocolo foi lançado em meados de junho, no Mercado Municipal de Curitiba, polo de valorização da cultura paranaense e cenário de grande comercialização de pinhão na capital.

Busca pela Indicação Geográfica (IG)
A rastreabilidade é um passo importante no processo de obtenção da Indicação Geográfica (IG). As caracterizações ambientais e do produto, com a análise sensorial, são itens que colaboram para viabilizar a solicitação do selo junto ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual ( Inpi ).

“Esse estudo mostra ao produtor as etapas necessárias para se obter o selo e quais os benefícios trazidos pelo selo de Indicação Geográfica, processo que depende da caracterização ambiental da região e do produto, nesse caso o pinhão. O setor de indicação geográfica e a rastreabilidade criam uma identidade regional, agregando valor ao produto e beneficiando produtores e consumidores”, diz Elenice Fritzsons , pesquisadora da Embrapa Florestas e autora da publicação.

As localidades indicadas no trabalho foram Lagoa Vermelha (RS); Painel (SC); Inácio Martins (PR); e Cunha (SP). Nesses municípios, de onde vieram os pinhões utilizados para análise, já existem comunidades rurais organizadas ou em vias de organização que têm no pinhão uma fonte alternativa e complementar. O Painel, inclusive, já possui três produtos com selo de Indicação Geográfica. Com informações da Embrapa.

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