Preservação da Amazônia é vital para a segurança nacional, aponta especialista

A Amazônia, historicamente visada por interesses estrangeiros, enfrenta atualmente uma complexa teia de ameaças internas que colocam em xeque sua biodiversidade, seus povos e o conhecimento ancestral da região. Embora o passado registre invasões europeias, cogitações de anexação pelos Estados Unidos no século XIX e casos de biopirataria como o patenteamento japonês do cupuaçu, a especialista em defesa e segurança nacional Mariana Plum argumenta que a atenção exclusiva às ameaças externas tem ofuscado perigos crescentes originados dentro do próprio país.
“Há inseguranças na Amazônia que afetam profundamente a nossa soberania e a de quem vive nela. Narcotráfico, tráfico ilegal, desmatamento, pesca ilegal e crime organizado transnacional. Esses são apenas alguns exemplos”, analisa Plum. Ela complementa que “facções criminosas vêm se alastrando de maneira assustadora. Crimes contra a floresta e infrações ambientais cresceram mais de 50% no último ano. A devastação da Amazônia está andando de mãos dadas com a criminalidade. Crimes que não geram nenhuma riqueza, não trazem desenvolvimento e não geram emprego”.
Mariana Plum, diretora-executiva do Centro de Soberania e Clima – uma instituição de pesquisa que defende a Amazônia como tema central da política de segurança nacional –, compartilhou suas reflexões em Belém, no TEDxAmazônia 2025. O evento reuniu lideranças indígenas, pesquisadores, ativistas ambientais e artistas para discutir a emergência climática e a defesa da floresta. Com experiência no Ministério da Defesa, no Exército e na Escola Superior de Guerra, ela reforça a urgência de uma atuação integrada entre governos, instituições militares e a sociedade civil na Amazônia.
A especialista defende que a floresta deve ser vista como uma infraestrutura essencial à segurança nacional, provedora de serviços indispensáveis à vida, como regulação climática, segurança hídrica, produção de alimentos e equilíbrio ecossistêmico. “O que está em risco não é somente a floresta, é a capacidade do Estado de repetir os fundamentos constitucionais mais básicos de cidadania e dignidade humana. Todos esses dependentes do primeiro fundamento constitucional: a soberania. Onde o Estado não chega, o crime ocupa. E onde o crime se instala, a floresta, as pessoas e o futuro ficam sob ameaça”, alertou.
Necessidade de um plano nacional e atuação integrada
Questionada sobre a fragmentação na atuação dos órgãos e profissionais responsáveis pela Amazônia, Plum explicou: “Usei o termo no sentido de que a gente precisa colocar todas as organizações que têm um papel na região para trabalhar de maneira conjunta. E isso significa estabelecer um plano nacional para a Amazônia, para que todos consigam estar na mesma página e trabalhar em prol dos mesmos objetivos. Quando a gente não tem um plano nacional para a região, acaba que cada ator vai fazendo aquilo que considera mais importante. Nesse processo de falta de escuta e de conversa, em vez de você caminhar para o mesmo objetivo, os caminhos seguem separados e essa não é a opção mais eficiente para resolver as questões na região.”
Os atores principais para essa articulação, segundo ela, incluem o governo federal e os diferentes governos estaduais e municipais, que precisam estar coordenados. No entanto, ela enfatiza a importância da sociedade civil, da academia e, sobretudo, dos indivíduos que vivem na floresta. “A gente precisa dos indivíduos, de quem está na floresta, porque são eles que sentem e vivem diretamente o que acontece ali. Então, não é possível a gente fazer uma política sem incluir as vozes locais, entender diferenças e complexidades da região pelos olhos deles. Só assim para implementar políticas públicas que façam sentido, não sejam desconectadas da realidade, não sejam perda de vida, de dinheiro e de tempo.”
O papel das Forças Armadas e o resgate do diálogo
Mariana Plum também destacou o papel fundamental das Forças Armadas na preservação e proteção ambiental da Amazônia. “A gente normalmente não olha para as Forças Armadas como tendo um papel na preservação e proteção ambiental. Claro, o papel principal delas é proteger o nosso território, proteger de ameaças externas. Mas elas estão na Amazônia há tanto tempo, há tantos anos que essa parte de preservação ambiental já faz parte do dia a dia das Forças Armadas.”
A especialista defendeu a necessidade de resgatar o diálogo crítico, mesmo diante de divergências, para construir convergências que impulsionem o propósito de preservar a Amazônia e garantir os direitos humanos, cidadania e oportunidades para as populações locais. “Infelizmente, o que a gente vê no Brasil hoje são divergências, polarizações. Temos que resgatar o que a gente sempre teve, que é a capacidade de dialogar criticamente mesmo com as divergências, porque a gente só cresce a partir dessas divergências.”
Sobre como integrar e reforçar a atuação das Forças Armadas em um momento crítico de imagem para a instituição, Plum sugeriu focar nas ações positivas e no resgate do diálogo. “Essa questão está relacionada com o próprio tema do TEDxAmazônia 2025, que fala sobre resgate. É tentar resgatar mesmo as boas ações que são feitas com diferentes atores, o que inclui as Forças Armadas. Tentar focar no que é positivo. Sem esquecer as coisas ruins, porque a gente aprende a partir do que é ruim, mas também focar naquilo que é positivo. Podemos crescer a partir das boas ações que já existem ali lideradas pelos militares. Mas para isso, a gente precisa voltar a conversar, a ter diálogo.”
Por fim, Plum acredita que a COP 30, a ser realizada em Belém, pode ajudar a ampliar a percepção da necessidade de mais investimentos na defesa da Amazônia. Ela citou exemplos recentes de como as Forças Armadas foram essenciais em desastres como as enchentes no Rio Grande do Sul, as queimadas no Pantanal e a seca na Amazônia. “Em todos esses exemplos, as Forças Armadas foram uma presença essencial, porque elas têm meios, porque elas têm capilaridade, porque elas têm um número grande de pessoas. A missão principal das Forças Armadas é proteger o país contra ameaças externas. Mas elas também têm um papel secundário, que tem se mostrado cada vez mais relevante de atuar nas questões climáticas e ambientais. Então, precisamos incluí-las na conversa, até para que consigam se organizar melhor em conjunto com os outros atores, em conjunto com a defesa civil, que, no caso de desastres, é quem tem a liderança no processo.” Com informações da Agência Brasil