Câmara dos Deputados aprovou nesta madrugada texto que flexibiliza licenciamento ambiental sob fortes críticas
A Câmara dos Deputados aprovou, na madrugada desta quinta-feira (17), um projeto de lei que estabelece novas e simplificadas regras para o licenciamento ambiental no Brasil. O texto, que agora segue para sanção presidencial, introduz novos formatos de licenças, reduz prazos para análises e facilita os processos de adesão. O substitutivo incorpora 29 emendas propostas pelo Senado ao Projeto de Lei 2159/21.
Entre as emendas incluídas, destaca-se a criação da Licença Ambiental Especial (LAE), destinada a empreendimentos considerados “estratégicos” por um conselho governamental ligado à Presidência da República, cujas prioridades serão definidas bianualmente. Essa nova modalidade de licença poderá ser concedida mesmo para projetos que apresentem “significativa degradação do meio ambiente”. O prazo máximo para a análise e decisão de um pedido de LAE será de 12 meses, com validade da licença variando de 5 a 10 anos.
Outra novidade é o licenciamento ambiental simplificado por adesão e compromisso (LAC), que poderá ser solicitado sem a exigência de estudos de impacto ambiental. Caberá a cada ente federativo (União, Estados, Distrito Federal ou Municípios) definir o porte e o potencial poluidor das atividades elegíveis para a LAC, que também terá vigência de 5 a 10 anos. Exemplos de obras que poderão se beneficiar desse tipo de licença incluem pavimentação, duplicação de rodovias e instalação de linhas de transmissão em faixas de domínio. Uma emenda recente, no entanto, dispensou totalmente o licenciamento ambiental para serviços e obras de manutenção e melhoramento de infraestrutura já existente, como rodovias pavimentadas e dragagens de manutenção.
Para obter a LAC, os interessados deverão cumprir certas condições, como possuir conhecimento prévio das características da região, da instalação e operação da atividade, dos impactos ambientais esperados e das medidas de controle necessárias. O texto também proíbe a supressão de vegetação em casos que dependam de autorização ambiental. Além disso, a análise por amostragem do Relatório de Caracterização do Empreendimento (RCE), que antes seria obrigatória, passará a ser facultativa. Uma emenda do Senado também determinou que, para mineração de grande porte ou alto risco, as normas do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) não serão observadas até que uma lei específica regule o tema.
Redução de poder de órgãos fiscalizadores e fortes críticas de ambientalistas
Uma emenda crucial aprovada retira o poder de diversos órgãos de definir os tipos de atividades ou empreendimentos que podem participar dos processos de licenciamento. Isso afeta entidades como a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Ministério da Igualdade Racial (para quilombolas), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). A partir de agora, as manifestações dessas entidades só serão consideradas se apresentadas dentro de um prazo máximo de 45 dias (30 dias padrão, com prorrogação de 15 dias mediante justificativa).
A aprovação do projeto durante a madrugada gerou forte repercussão e críticas por parte de parlamentares e entidades ambientalistas. A deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG) classificou o projeto como “o maior retrocesso ambiental dos últimos 40 anos”. Em suas redes sociais, ela afirmou que o “PL da devastação” enfraquece as leis ambientais, facilita o desmatamento e coloca em risco povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e comunidades tradicionais.
A parlamentar alertou que o projeto poderá aumentar crimes ambientais, intensificar o desmatamento e agravar a crise climática, além de impactar a pobreza e a insegurança alimentar, principalmente entre mulheres e meninas. Célia Xakriabá sentenciou que “esses que votaram a favor desse retrocesso são os exterminadores do futuro”. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) descreveu o autolicenciamento como “uma fraude autorizada, que compromete o presente e o futuro”. O coordenador da Frente Parlamentar Mista Ambientalista, deputado Nilto Tatto (PT-SP), afirmou que o texto, da forma como foi aprovado, não resolverá os gargalos do licenciamento ambiental.
Deputadas como Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e Duda Salabert (PDT-MG) expressaram preocupação de que a aprovação do projeto possa levar a novas tragédias ambientais, citando os rompimentos de barragens em Brumadinho e Mariana, em Minas Gerais. Salabert criticou a votação em plenário “vazio e em votação virtual, depois de meia-noite”, para um projeto “estruturante para política socioambiental do Brasil”.
A ONG ambientalista WWF-Brasil divulgou uma nota classificando o projeto como o “PL da Devastação”, argumentando que ele abrirá caminho para uma destruição ambiental sem precedentes. A entidade afirma que o texto desmantelará o sistema de licenciamento ambiental brasileiro, violará princípios constitucionais e fragilizará instrumentos de proteção ambiental. A WWF-Brasil criticou a decisão “sem diálogo com a sociedade”, alertando para impactos irreversíveis ao meio ambiente e à população. A ONG ressaltou que o autolicenciamento inviabilizará análises técnicas adequadas e que a Licença Ambiental Especial, definida por um “conselho político (e não técnico)”, pode simplificar autorizações para empreendimentos de grande porte e risco, como a exploração de petróleo e gás na Margem Equatorial. A nota finaliza afirmando que o projeto dispensa licenciamento para atividades agropecuárias, o que pode levar a desmatamento e poluição, ameaçando a segurança hídrica e representando “um ataque frontal aos direitos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais”. Com informações da Agência Brasil/Agência Câmara de Notícias