Faculdade Indígena adota o Sisteminha como laboratório vivo de produção de alimentos
Uma parceria inédita entre a Embrapa Agropecuária Oeste (MS) e a Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) resultou na inclusão do Sisteminha Embrapa na grade curricular da Faculdade Intercultural Indígena (Faind). Essa integração transforma a tecnologia social em uma ferramenta pedagógica, acelerando a transferência de conhecimentos essenciais para a segurança alimentar dos povos originários da região.
O Sisteminha é um modelo circular e sustentável que utiliza a piscicultura intensiva em tanques de baixo custo. A água residual desses tanques, rica em nutrientes, é então usada para irrigar o cultivo de hortaliças e frutas, viabilizando a produção integrada em áreas reduzidas.
Laboratório vivo e autonomia para as comunidades
A instalação de uma Unidade de Referência Tecnológica (URT) do Sisteminha no campus da Faind, em Dourados, em agosto, concretizou a iniciativa. A URT já é utilizada nas disciplinas de Educação Ambiental, Agroecologia e Sustentabilidade, funcionando como um verdadeiro laboratório vivo. A primeira colheita, em outubro, demonstrou o êxito inicial do projeto.
Para o chefe-geral da Embrapa Agropecuária Oeste, Harley Nonato de Oliveira, a iniciativa vai além da produtividade, promovendo autonomia e sustentabilidade aos povos indígenas e reafirmando a importância da educação intercultural e da pesquisa participativa.
A Faind, que forma professores e líderes indígenas, adota a metodologia de pedagogia da alternância. O professor Adenomar de Neves Carvalho explica que o processo inclui o Tempo Universidade (TU) para estudos teóricos e oficinas, e o Tempo Comunidade (TC), onde os estudantes aplicam o conhecimento em suas aldeias. Dessa forma, o Sisteminha é levado diretamente aos territórios como uma solução sustentável.
Resgate cultural e nutricional
Estudantes indígenas veem no Sisteminha uma oportunidade de unir a inovação com a cultura ancestral. O mestrando Guarani Adriano Serrano destaca que a tecnologia complementa o saber tradicional da “roça consorciada” e pode fortalecer o conhecimento sobre a soberania alimentar nos territórios Guarani-Kaiowá.
Ele argumenta que o modelo quebra o paradigma atual de dependência de alimentos industrializados e de baixa qualidade comprados na cidade. Ao produzir alimentos próprios, o Sisteminha não só gera bem-estar, mas também resgata a memória ancestral, valorizando os hábitos alimentares e o modo de vida do povo, como ressaltou o estudante Sidimar Franco Aquivel.
Além da produção de peixes, que resgata a tradição de seus antepassados, o Sisteminha permite o uso de saberes como a compostagem e o adubo verde.
Detalhes técnicos e próximos passos
A URT instalada utiliza um tanque pré-fabricado de concreto com cerca de 10 m³, operando com recirculação de água. A capacidade de produção estimada é de até 30 quilos de peixe por ciclo de aproximadamente 100 dias. O pesquisador da Embrapa Laurindo André Rodrigues enfatiza que o elemento-chave é o valor técnico-científico da recirculação contínua dos nutrientes, que garante a produção integrada de alimentos de qualidade em espaços reduzidos, aumentando a autonomia alimentar.
A Faind já planeja desdobramentos, como a implantação do Módulo 1 do Sisteminha na Aldeia Indígena Laranjeira Nhanderu, em Rio Brilhante (MS), para apoiar a produção sustentável de alimentos local. Inclusive, o acadêmico Rojânio da Silva Pedro, bolsista do projeto, está trabalhando na tradução do Manual de Boas Práticas do Sisteminha para a língua tupi-guarani, a fim de facilitar a difusão da tecnologia.
O reitor da UFGD, Jones Dari Goettert, conclui que essa parceria representa o verdadeiro sentido da universidade pública: produzir conhecimento para transformar a realidade, unindo ciência, cultura e território em prol da inclusão social. Com informações da Assessoria de Comunicação da Embrapa


