Estudo Alerta: demência em idosos hospitalizados passa despercebida em até metade dos casos

Uma pesquisa liderada por cientistas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) acende um sinal de alerta: condições associadas ao envelhecimento, como o comprometimento cognitivo e a demência, são frequentemente despercebidas pelas equipes de saúde em hospitais, mesmo sendo cada vez mais comuns.

A demência representa um dos maiores desafios de saúde pública em nível global, afetando atualmente cerca de 57 milhões de pessoas, das quais aproximadamente 2,5 milhões são brasileiros. As projeções para 2050 são alarmantes, indicando que esse número pode quase triplicar, superando os 150 milhões de casos em todo o mundo.

Segundo Márlon Aliberti, primeiro autor do estudo e professor colaborador da FMUSP, essa falha na identificação ocorre porque a atenção dos profissionais no ambiente hospitalar tende a se concentrar na condição aguda que levou à internação do paciente, como pneumonia, infecção urinária ou descompensação cardíaca.

“No entanto, a demência influencia diretamente a resposta a medicamentos, aumenta o risco de delírio, prolonga a internação e dificulta a reabilitação”, explica Aliberti, ressaltando o impacto crucial da doença no tratamento hospitalar.

O estudo, que foi publicado no Journal of the American Geriatrics Society, revelou que aproximadamente dois terços dos pacientes hospitalizados com 65 anos ou mais apresentam algum grau de comprometimento cognitivo, como déficits de memória. Além disso, um terço desses pacientes já possuía um diagnóstico de demência.

“Essas alterações já estavam presentes antes do problema agudo que motivou a internação. No entanto, entre os casos de demência, aproximadamente metade nunca havia sido diagnosticada, permanecendo desconhecida tanto por médicos quanto por familiares até o momento da hospitalização”, esclarece Aliberti.

Nova abordagem promissora para triagem precoce
Diante desse cenário, os pesquisadores propõem uma solução prática e viável, mesmo em ambientes com recursos limitados: realizar, nos primeiros dias de internação, uma entrevista à beira do leito com um familiar ou cuidador próximo. O objetivo é avaliar a memória e outras funções cognitivas do paciente antes do episódio agudo que motivou a hospitalização.

A professora associada da FMUSP e responsável pela supervisão do estudo, Claudia Suemoto, explica que essa abordagem permite identificar alterações cognitivas preexistentes, mesmo quando o paciente está desorientado, com dor ou incapaz de participar diretamente da avaliação. Ela enfatiza que não se trata de um diagnóstico definitivo, mas de uma triagem eficiente capaz de apontar uma possível demência e auxiliar no planejamento do cuidado hospitalar mais adequado.

“A identificação precoce do comprometimento cognitivo também permite orientar melhor os cuidados após a alta. Por exemplo, se a pessoa vive sozinha, os familiares podem ser preparados para oferecer mais suporte, o que pode evitar novas internações”, afirma a médica Claudia Suemoto.

O novo método foi testado com sucesso em cinco hospitais de três capitais brasileiras – São Paulo, Belo Horizonte e Recife – e demonstrou uma eficácia superior a 90%. Com os resultados positivos, a abordagem será estendida para toda a rede de instituições do grupo de estudo Change (Creating a Hospital Assessment Network in Geriatrics), da Faculdade de Medicina. Mais de 250 profissionais já foram capacitados para aplicar a ferramenta em 43 hospitais, tanto públicos quanto privados, em todas as regiões do Brasil e em outros quatro países: Angola, Chile, Colômbia e Portugal.

O estudo foi conduzido pelo Laboratório de Investigação Médica em Envelhecimento, sob a supervisão da professora Claudia Suemoto, em colaboração com a professora Monica Yassuda, docente do curso de Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidade da USP, e com a médica Regina Magaldi, da Divisão de Geriatria do Hospital das Clínicas da USP. Com informações da Agência Brasil

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