Tuberculose tem cura, mas adesão ao tratamento ainda é desafio em MG

Eliminar a tuberculose (TB) em Minas, no Brasil e no mundo até 2030. Essa meta exige o esforço conjunto dos serviços de saúde pública e das pessoas infectadas por uma enfermidade milenar que tirou a vida de 1,3 milhões de homens, mulheres e crianças mundialmente em 2022, uma média diária de 3,5 mil óbitos. Em solo nacional, foram 5 mil mortes e 78 mil novos casos no mesmo ano. Globalmente, é a segunda doença infecciosa e transmissível que mais mata (após a covid-19).

O principal obstáculo para a cura da tuberculose, cujo dia mundial de combate foi celebrado ontem (24/3), continua sendo o abandono do tratamento. Estima-se que uma pessoa infectada possa contaminar outras dez ou 15 com as quais tiver contato no período de um ano.

Como esclarece o pneumologista do Hospital Júlia Kubitschek, do Complexo de Especialidades da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) e referência estadual para os casos de tuberculose multirresistente Ednei Guimarães, “quando o paciente segue corretamente as orientações, tomando os medicamentos até o final do período estipulado, a cura é próxima de 100%”.

No território mineiro, nos últimos quatro anos, a cada dia, uma média de 14 pessoas foram diagnosticadas com tuberculose, num total de 20.363 casos notificados. Outras 1.735 morreram em razão da doença no mesmo período, entre casos gerais e demais causas associadas à TB (comorbidades).

Considerando apenas os casos novos, que somaram 15.977 ocorrências, quase 50% alcançaram a cura, ou seja, 7.506 pessoas superaram a doença.

Correta adesão
“Apesar da tuberculose ser uma doença curável, traz consigo a gravidade e o risco de óbito, especialmente nos casos em que os sintomas demoram a ser percebidos e o tratamento é iniciado com atraso. A morte também pode ocorrer nas situações de abandono do tratamento e reincidência da enfermidade”, completa o pneumologista.

A correta adesão é crucial tanto do ponto de vista individual como também da saúde coletiva e da eliminação de uma epidemia de alcance global nos próximos seis anos, como propõem as organizações Mundial (OMS) e Pan-Americana da Saúde (Opas), que traçaram metas com base nos relatórios de 2022.

Trabalho conjunto
Em sintonia com as organizações mundiais, que também respondem pelo tema da campanha deste ano: “Sim, nós podemos acabar com a tuberculose!”, o Ministério da Saúde (MS) e a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) estabeleceram, em 2023, a campanha nacional para a eliminação da doença – Brasil Livre da Tuberculose e o Plano Estadual pelo Fim da Tuberculose como Problema de Saúde Pública – estratégias para 2023-2026, respectivamente.

O Comitê Mineiro para o Controle Social da Tuberculose, que integra a Coordenação de Hanseníase e Tuberculose (CHT) da SES, promove a participação da sociedade civil nas ações de advocacy (defesa e argumentação em favor da causa), comunicação e mobilização social.

O CHT é formado por órgãos públicos, entidades não governamentais, pessoas acometidas pela tuberculose e por quem vive com o HIV/AIDS ou outras comorbidades, interessados em apoiar ações de controle da TB.

Segundo a Opas, a tuberculose está entre as 30 doenças transmissíveis que compõem a “Iniciativa para a Eliminação de Doenças nas Américas”. Entre as ações propostas estão: antecipar a adoção de novos métodos de diagnóstico, tratamento com menor duração e orais para a tuberculose multirresistente a medicamentos e inovar nas estratégias para a busca de casos.

Nesse contexto, os hospitais Júlia Kubitschek (HJK) e Eduardo de Menezes (HEM), da Fhemig, exercem, historicamente, papel fundamental no enfrentamento à doença.

O HJK, que participa da Rede Estadual de Atenção às Doenças Complexas, atua, de forma integral, nos casos de tuberculose multirresistente e o HEM é a referência para o atendimento ambulatorial e a internação de pacientes com tuberculose extrapulmonar, coinfecção tuberculose/HIV e infecções causadas por micobactérias não tuberculosas.

Também é corresponsável pelo matriciamento dos Serviços de Atenção Especializada (SAEs ampliados) no estado, para o encaminhamento de pacientes, discussão de casos e treinamentos de profissionais da saúde.

Perfil dos doentes
A maioria (73,09%) dos acometidos pela doença em Minas são do gênero masculino e estão na faixa etária dos 20 aos 50 anos.

A distribuição dos casos no estado nos últimos quatro anos,confirma a tendência nacional e mundial tanto de gênero quanto de idades. De 40 a 49 anos houve 3.186 registros; de 30 a 39 anos: 2.980 e de 20 a 29 anos foram 2.946 ocorrências.

A taxa de abandono superior a 10% (2.248), verificada no período entre 2020 e o início de 2024 no estado, reflete e amplia esse perfil do ponto de vista socioeconômico.

Os portadores da doença que desistem do tratamento, em sua maioria, são indivíduos privados de liberdade, em situação de rua, usuários de álcool e outras drogas.

“A rede de assistência é estruturada e adequada, não faltam profissionais, nem medicação. Como o tratamento requer uso diário e prolongado de comprimidos – no mínimo por seis meses, quando acreditam que estão curadas, essas pessoas abandonam o tratamento antes da sua conclusão”, pondera Ednei Guimarães.

Vulnerabilidade
Como mostram diversas pesquisas nacionais e internacionais, as pessoas com tuberculose se situam nos extratos sociais de maior vulnerabilidade e marginalização, e enfrentam várias barreiras para o acesso à atenção à saúde.

“Um caso não curado, especialmente por causa do abandono, tem grande potencial de transmissão e de continuar propagando a doença”, pontua o pneumologista.

Ainda de acordo com Ednei Guimarães, os principais fatores de adoecimento da população estão ligados à capacidade de defesa imunológica do indivíduo. Quanto mais debilitado, maior o risco de adoecimento. Essa debilidade pode estar relacionada a doenças como diabetes, câncer, HIV, alcoolismo, drogadição entre outras.

Tipos
Há dois tipos de tuberculose. A pulmonar, que responde por 70% dos casos da doença, e a extrapulmonar. A primeira possui diagnóstico mais fácil, enquanto para a segunda o diagnóstico é mais complexo pois pode abranger áreas como a cabeça, os ossos e as articulações e o sistema nervoso central, e resultar em casos mais graves e com maiores chances de óbito do paciente.

A tuberculose é uma doença infectocontagiosa de abrangência mundial, causada pela bactéria Mycobacterium tuberculosis, conhecida como Bacilo de Koch. Essa bactéria afeta principalmente os pulmões, mas pode atingir outras partes do organismo, gerando o quadro de tuberculose extrapulmonar.

De modo geral, a doença é transmitida pela via respiratória da pessoa portadora do bacilo, que o elimina no ambiente. O contágio se dá pela inalação dos aerossóis provenientes da tosse, fala ou espirro do doente. Ambientes fechados, mal ventilados, sem luz solar e com muitas pessoas, aumentam significativamente as chances de transmissão.

A tosse, acompanhada de escarro, é o sintoma mais frequente nos casos de tuberculose pulmonar. Caso persista por três ou mais semanas, o médico deve ser consultado. Outros sintomas associados à doença são emagrecimento, fraqueza, cansaço, dores no corpo, febre baixa, geralmente ao entardecer, e suor noturno.

O diagnóstico da tuberculose pulmonar é feito por meio de três exames – baciloscopia, teste rápido molecular e cultura. As Unidades Básicas de Saúde (UBS) realizam o teste rápido e gratuito, com sensibilidade de até 97%. Não existe vacinação preventiva para adultos. A vacina disponível (BCG) tem como único público-alvo crianças com um mês de vida.

Coinfecção
De acordo com a infectologista e gerente assistencial do Hospital Eduardo de Menezes (HEM) – que integra o grupo das Unidades Assistenciais de Referência da Fhemig, Tatiani Fereguetti, desde o seu surgimento, o vírus HIV se tornou um marco na história epidemiológica da tuberculose e vice-versa, de modo que a tuberculose é uma condição oportunista frequente e com grande potencial de complicações para pessoas que vivem com HIV/aids, especialmente nos casos mais avançados. A aids promoveu o agravamento da epidemia de tuberculose e tornou o seu controle ainda mais difícil.

“A boa notícia é que, atualmente, ambas as condições têm tratamentos eficazes, capazes de curar a tuberculose e controlar a infecção pelo HIV por toda a vida, desde que a medicação seja tomada de acordo com a orientação médica”, explica a infectologista.

Multirresistente
A tuberculose é classificada como resistente quando o bacilo se torna resistente a algum dos medicamentos usados para combatê-lo. Para ser multirresistente, tem que ter resistência, ao mesmo tempo, aos dois principais e mais eficazes medicamentos – a Rifampicina e a Isoniazida.

O hospital Júlia Kubitschek é referência estadual para o tratamento da tuberculose resistente e multirresistente há décadas. Ele fornece atenção integral, do atendimento ambulatorial à internação em ala de isolamento respiratório, além de toda a estrutura de suporte para a realização dos exames necessários.

Algumas comorbidades que causam a redução do estado de defesa imunológica do paciente podem influenciar de forma negativa o sucesso do tratamento.

Por isso, é fundamental que o tratamento seja realizado da forma correta e que haja o controle adequado da doença de base para restaurar as defesas imunológicas e aumentar as chances de cura da tuberculose. Com Agência Brasil

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