Estudo revela que acidez dos oceanos atinge nível crítico, ameaçando equilíbrio planetário

A acidificação dos oceanos, um fenômeno impulsionado pela absorção excessiva de gás carbônico (CO2) da atmosfera, ultrapassou os limites considerados seguros para o equilíbrio do planeta em 2020. A revelação foi feita em um estudo divulgado nesta semana por cientistas do Laboratório Marinho de Plymouth (PML) do Reino Unido.

Intitulado “Acidificação dos oceanos: mais um limite planetário ultrapassado”, o estudo só trouxe à tona essa informação cinco anos após o evento, graças ao uso de metodologias de medição mais modernas e à aplicação de novos modelos computacionais em dados coletados ao longo dos último século e meio.

“Temos uma informação robusta, produzida por um estudo de alcance mundial, revelando algo que, infelizmente, ainda não tínhamos. Apesar das observações e modelos matemáticos, essas informações ainda não haviam sido integradas ao contexto dos limites planetários. Esse foi o grande avanço”, explicou Alexander Turra, pesquisador do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IOUSP) e coordenador da Cátedra Unesco para a Sustentabilidade do Oceano.

O conceito de limites planetários, criado em 2009 por cientistas do Centro de Resiliência de Estocolmo, monitora nove fenômenos resultantes da atividade humana, incluindo mudanças climáticas, poluição química, alteração no uso da terra e a acidificação dos oceanos. Anteriormente, a comunidade científica indicava que seis desses limites já haviam sido excedidos.

Com a descoberta do novo estudo, a alteração na acidez das águas oceânicas eleva essa lista para sete.

“Isso nos acende um alarme adicional em relação a essa degradação do oceano. Especialmente porque é um fenômeno silencioso e imperceptível em nosso dia a dia, diferente do lixo no mar, que é muito evidente”, alertou Turra.

Impactos devastadores na vida marinha e ecossistemas
Com a absorção de altas concentrações de gás carbônico da atmosfera, os oceanos experimentam uma diminuição do potencial hidrogeniônico (pH) e, consequentemente, uma redução na concentração de carbonato de cálcio na água. Isso afeta diretamente a formação de esqueletos e o crescimento de diversas formas de vida marinha.

“Isso significa menos crescimento de recifes de coral, conchas de moluscos mais frágeis, otólitos [estruturas de cálcio em peixes] menos desenvolvidos, e teremos, portanto, organismos com capacidade limitada de se relacionar com o meio ambiente devido a esse comprometimento”, detalhou o pesquisador.

Segundo Letícia Cotrim, coordenadora do Laboratório de Oceanografia Química da UERJ, a acidificação também pode provocar alterações na fisiologia, crescimento e reprodução de espécies, impactando a biodiversidade oceânica.

O estudo propõe ainda que o limiar de 10% de redução na concentração de carbonato de cálcio abaixo dos níveis pré-industriais seja a referência para esse limite planetário. Essa proposta se baseia na observação do comprometimento de habitats de espécies como moluscos, cuja sobrevivência depende de conchas calcificadas.

Urgência climática e o papel do Brasil na COP30
De acordo com os pesquisadores, quando essa fronteira foi ultrapassada em 2020, observou-se um comprometimento de 60% do oceano com profundidade de até 200 metros, e 40% da superfície oceânica em todo o planeta.

“Incluindo uma redução de 43% no habitat dos recifes de coral tropicais e subtropicais, até 61% para os pterópodes polares (borboletas marinhas) e 13% para os bivalves costeiros”, destaca a pesquisa.

Para a pesquisadora, o estudo reforça o que cientistas têm afirmado há décadas: quanto mais CO2 na atmosfera, mais rapidamente os limites estabelecidos pelo Acordo de Paris serão ultrapassados. O limite de 1,5ºC de aquecimento global é considerado gerenciável para evitar maiores perdas de vidas humanas, prejuízos na produção, problemas mais severos – e custosos – com eventos climáticos extremos e com a elevação do nível do mar.

Para Turra, o Brasil, como um país marítimo e que sediará, em novembro, a próxima Conferência das Nações Unidas sobre o Clima (COP30), deve ter um protagonismo central nessa discussão. A implementação de ações efetivas no país poderia servir como um exemplo global.

“Vamos poder fazer uma conexão muito clara entre o oceano e o clima na COP30, a ponto de fortalecer com mais esse argumento a necessidade de reduzir as emissões e de aumentar o sequestro e a estocagem de carbono”, concluiu. Com informações da Agência Brasil

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