Revelado o novo mapa da agricultura brasileira: onde a terra tem mais potencial
Uma ferramenta essencial para o futuro da agricultura no Brasil acaba de ser atualizada e disponibilizada ao público. O mapa de aptidão agrícola das terras do Brasil, na escala de 1:500.000, oferece uma visão regional detalhada do potencial de uso do solo para lavouras em três níveis de manejo, além de indicar áreas mais adequadas para pastagem plantada, silvicultura ou pastagem natural. Os estudos que fundamentam essa classificação foram desenvolvidos por pesquisadores da Embrapa Solos (RJ) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com financiamento do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
O mapa está acessível gratuitamente nas plataformas Infraestrutura de Dados Espaciais da Embrapa (GeoInfo) e no Portal de Dados da Plataforma Tecnológica do PronaSolos. Este valioso ativo cartográfico servirá de base para a formulação de políticas públicas relacionadas ao uso da terra e para a tomada de decisões em escala regional, visando a conservação e a sustentabilidade da atividade agrícola. A versão atual é considerada uma segunda aproximação, e passará por uma etapa final de revisão e aprimoramento para complementar e refinar as informações.
Compreendendo o potencial: níveis de manejo e fatores limitantes
A metodologia empregada para a criação do mapa avaliou as terras quanto às suas possibilidades de aproveitamento agropecuário, considerando suas qualidades naturais e a viabilidade de melhoria das condições agrícolas através do uso de insumos e da aplicação de diversas práticas de manejo, em distintos níveis tecnológicos.
Para cada tipo de solo, foram analisadas as possíveis interações entre os atributos mais relevantes para os cinco fatores que limitam o uso agrícola da terra: deficiência de fertilidade, escassez de água, deficiência de oxigênio (ou excesso de água), suscetibilidade à erosão e impedimentos à mecanização. No caso da aptidão para silvicultura, o fator “impedimentos ao enraizamento” foi considerado adicionalmente.
Para cada um desses fatores, os pesquisadores atribuíram graus de limitação – nulo, ligeiro, moderado, forte, muito forte, extremamente forte e intermediários – que expressam o desvio das terras em relação a uma situação ideal. Levando em conta as diferentes condições socioeconômicas do agricultor, foram definidos três níveis de manejo (A, B e C), representando distintos níveis tecnológicos: o nível A, para técnicas simples e rudimentares; o nível B, com recursos tecnológicos intermediários, adequado a produtores de média capacidade de investimento; e o nível C, correspondente à agricultura moderna altamente tecnificada, com aplicação intensiva de capital e tecnologia.
De acordo com o pesquisador da Embrapa Amaury de Carvalho Filho, essa diferenciação permite identificar o potencial de uso das terras tanto para pequenos produtores rurais, com baixo grau de instrução e descapitalizados, quanto para agricultores de nível médio e para a agricultura em escala empresarial. “Assim, por exemplo, uma determinada área com condições topográficas ou de solo desfavoráveis ao emprego de máquinas e implementos agrícolas pode não ser apropriada para a implantação de lavouras altamente tecnificadas, que requerem grande escala de produção, mas em contrapartida pode apresentar boas condições para o uso com agricultura familiar, em nível tecnológico mais baixo, possibilitando boa rentabilidade com modesto emprego de capital”, explica.
A classificação da aptidão agrícola prioriza as possibilidades de usos mais nobres da terra, como é o caso das lavouras, seguida de usos menos intensivos.
Para cada condição de manejo especificada no procedimento metodológico adotado – níveis A, B e C – foram identificadas as classes de aptidão agrícola “boa”, “regular” ou “restrita” para o uso com lavouras dos solos que ocorrem nas distintas unidades cartografadas no mapa. Por outro lado, caso o solo apresente condições inadequadas para exploração com culturas agrícolas, foram avaliadas as possibilidades de usos menos intensivos, referentes a pastagem plantada, pastagem nativa e silvicultura. “A avaliação para exploração florestal, ou silvicultura, no nível mais avançado (nível C) foi incorporada como uma inovação à metodologia utilizada. É um diferencial em relação aos trabalhos anteriores”, acrescenta Carvalho Filho.
O pesquisador reforça que um ponto importante da metodologia é a apresentação em formato digital da classificação da aptidão de maneira conjunta, indicando, ao mesmo tempo, o potencial das terras para uso com lavouras nos três níveis de manejo ou para usos menos intensivos, com pastagem plantada, silvicultura, em nível tecnológico médio ou alto, ou pastagem nativa.
“Resumindo, esse mapa de aptidão agrícola das terras do Brasil apresenta a classificação para diferentes tipos de uso e níveis tecnológicos de exploração. Assim, para cada unidade espacial delimitada no mapa, e para os seus respectivos solos, são indicadas as classes de aptidão ‘boa’, ‘regular’ ou ‘restrita’ para lavouras nos três níveis de manejo, para pastagem plantada, para silvicultura ou para pastagem nativa, expressando o máximo potencial de uso agrícola de suas terras em nível regional”, detalha o pesquisador.
Outra indicação importante é a falta de viabilidade do aproveitamento agrícola de determinadas áreas (classe inapta), caso não apresentem condições mínimas de sustentabilidade econômico-ambiental, devendo ser destinadas à preservação da natureza ou a algum outro tipo de uso não agrícola.
Como o novo mapa foi elaborado: fontes de dados e metodologia
Os especialistas informam que os dados de entrada para o desenvolvimento do trabalho de avaliação do potencial das terras do Brasil para uso agrícola são oriundos do Mapa de Solos do Brasil, na escala 1:250.000, lançado pelo IBGE em 2018, conjugado ao Mapa de Áreas não Desmatadas da Amazônica Legal, conforme mapeamento de 2007 do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), liderado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e ao Mapa de Unidades de Conservação de Proteção Integral e Terras Indígenas, lançado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) em 2020.
O pesquisador Amaury de Carvalho Filho explica que o trabalho foi realizado de acordo com o Sistema de Avaliação da Aptidão Agrícola das Terras, método adotado pela Embrapa, desenvolvido para atender às necessidades gerais de planejamento do uso das terras e propiciar a decodificação das informações técnicas disponibilizadas nos levantamentos pedológicos. Esses estudos viabilizam a aplicação prática do inventário dos recursos de solos de determinada área ou região, cuja distribuição espacial é representada em mapas de solos de diferentes escalas.
Para interpretar a grande quantidade de dados disponíveis no mapa de solos do Brasil, a avaliação foi realizada por meio do estabelecimento de cruzamentos entre as diferentes características expressas na denominação dos solos, correspondentes aos quatro níveis do Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (SiBCS), e informações de textura, tipo de horizonte superficial, saturação por bases, relevo e ocorrência de pedregosidade, rochosidade e erosão.
“Os trabalhos de avaliação da aptidão agrícola por meio desse método são realizados há bastante tempo, abrangendo áreas de dimensões variadas, desde microbacias até grandes regiões, incluindo unidades da federação. Mas ainda não havia sido realizada uma avaliação semelhante a essa que estamos lançando, que aborda todo o território nacional de uma forma integrada”, acrescenta.
O pesquisador ressalta, ainda, que foram excluídas dessa avaliação as áreas de unidades de conservação (estaduais e federais) e as terras indígenas, bem como as áreas não desmatadas da Amazônia Legal. “Assim, devido à condição especial do bioma Amazônia, reserva natural da biodiversidade, somente suas áreas desmatadas foram consideradas na avaliação da aptidão agrícola, com o propósito de embasar a exploração sustentável das terras já incorporadas ao processo produtivo.”
Acesso e aplicações do mapa: do planejamento regional à política pública
O mapa de aptidão agrícola das terras está disponível gratuitamente na plataforma da Infraestrutura de Dados Espaciais da Embrapa (GeoInfo). Pode ser acessado pelos links:
Mapa: Acesse AQUI
Painel de informações: Acesse AQUI
O mapa também está disponível na plataforma tecnológica do PronaSolos, na aba Zoneamentos/Interpretações.
Devido à grande extensão territorial do Brasil e ao caráter generalizado das informações sobre os solos e condições ambientais que embasam a interpretação realizada, o mapa de aptidão agrícola é apresentado na escala 1:500.000, considerada pelos pesquisadores mais adequada para representação do potencial de uso das terras. Por isso, sua aplicação é indicada para planejamentos de caráter regional – estados, regiões administrativas e grandes bacias hidrográficas.
Nessa escala, os cientistas do solo destacam que as informações do mapa nacional de aptidão agrícola podem ser usadas, por exemplo, para fins de direcionamento de atividades agropecuárias e alocação de recursos e regionalização de incentivos, ou mesmo para definição da distribuição de redes viárias de escoamento da produção, priorização de estratégias conservacionistas em áreas mais vulneráveis à degradação e também como subsídio a zoneamentos diversos. “Além disso, este mapeamento pode ser utilizado na avaliação do potencial de expansão da produção agrícola em nível municipal ou de microrregiões geográficas, assim como para direcionamento e adequação de projetos de extensão rural ou, ainda, para identificação de áreas preferenciais para preservação e formação de parques”, salienta o pesquisador da Embrapa José Francisco Lumbreras.
Dois programas de estado que devem ser diretamente beneficiados são o Programa Nacional de Levantamento e Interpretação de Solos do Brasil (PronaSolos) e o Programa Nacional de Zoneamento de Risco Climático (Zarc).
“Mesmo com a limitação inerente à pequena escala deste mapa de aptidão agrícola do Brasil, cujas unidades espacializadas abrangem áreas extensas, de no mínimo mil hectares, o que torna inviável sua aplicação direta para tomada de decisão em nível de fazendas, as informações podem ser utilizadas por cooperativas rurais e associações de produtores, ou mesmo por proprietários de áreas maiores, como instrumento auxiliar para avaliações de adequação e riscos de insucesso de empreendimentos agropecuários”, pondera Lumbreras. Com informações da Embrapa


