Uma década de luta: Mariana clama por justiça dez anos após o desastre do Fundão

Nesta quarta-feira, 5 de novembro, completa-se dez anos do rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana (MG), um dos maiores desastres ambientais e sociais da história do país. Operada pela Samarco, a barragem liberou cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, tirando a vida de 19 pessoas e deixando mais de 600 desabrigadas em comunidades como Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo.

Para moradores como Mônica Santos, ex-residente de Bento Rodrigues, a passagem de uma década não atenuou o sofrimento. A dor e a imagem dos escombros cobertos de lama permanecem vívidas. “É como se estivesse tudo acontecendo agora”, desabafou a líder comunitária à Agência Brasil, ressaltando que, dez anos depois, a busca por justiça e reparação continua sendo uma luta diária.

A dor do dia seguinte
Mônica, que na época trabalhava em um consultório odontológico, estava fora de casa no momento da tragédia. Ela recorda ter recebido a ligação de uma prima, o desespero na busca pela mãe e a longa jornada de volta. Foi apenas ao amanhecer, quando conseguiu avistar a área de um ponto mais alto, que a ficha caiu: sua casa estava submersa na lama.

A líder comunitária lamenta que a Samarco sempre garantiu à comunidade a segurança da barragem, alegando monitoramento ininterrupto. Além da perda material, Mônica perdeu cinco amigos próximos no desastre.

Atualmente, Mônica reside no Novo Bento Rodrigues, o reassentamento entregue pela Samarco, situado a cerca de 13 quilômetros de sua antiga comunidade. No entanto, ela critica as condições do local. “A gente não pode falar que foi entregue 100%. Uma vez que ainda tem casa sendo construída e ainda tem morador desabrigado que nem projeto de casa tem”.

Luta por reparação completa e responsabilização
A líder comunitária enfatiza que é imperativo continuar lutando para que todas as vítimas sejam devidamente indenizadas e restituídas. Ela menciona, inclusive, que as casas entregues pela empresa ainda não estão registradas em nome dos desabrigados.

A principal esperança dos afetados é a punição dos responsáveis, na crença de que a falta de responsabilização contribuiu para a ocorrência de uma tragédia posterior. “Se tivesse acontecido a punição, não teria ocorrido a tragédia de Brumadinho (em 2019 e que deixou 272 mortos)”.

O reflexo de um “projeto antidemocrático”
Márcio Zonta, da direção nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração, avalia que o desastre de Mariana é um sintoma de um sistema em que as decisões minerárias são desconectadas da população. Ele classifica o modelo como um “projeto antidemocrático, em que as empresas não levam em consideração as organizações e populações”.

O ativista destaca que o Brasil ainda possui 916 barragens, com 74 delas apresentando risco mais elevado de colapso, sendo 91 em situação de alerta. Em Minas Gerais, onde a Vale iniciou o que chama de Sistema Sul de Mineração, a situação é mais crítica, com 31 barragens sob risco. Para Zonta, os eventos de Mariana e Brumadinho representam o colapso desse sistema de mineração da Vale.

O promotor de justiça Guilherme de Sá Meneguin, do Ministério Público de Minas Gerais, afirmou ao programa Caminhos da Reportagem, da TV Brasil, que o rompimento atingiu 3 milhões de pessoas em Minas Gerais e no Espírito Santo. Ele classificou o ocorrido como “mais do que um crime ambiental, foi uma grave violação dos direitos humanos, que foi se perpetuando ao longo do tempo”.

Indenizações e o avanço da regulamentação
A Samarco informou à Agência Brasil que, desde 2015, foram destinados R$ 68,4 bilhões para ações de compensação e reparação. Desse montante, R$ 32,1 bilhões foram utilizados no pagamento de 735 mil acordos de indenização individual. A empresa defende que os recursos têm impulsionado a economia local, gerando emprego e estimulando o comércio.

O superintendente executivo da Agência Nacional de Mineração, Júlio César Rodrigues, reconheceu que houve avanço na regulamentação de barragens, que hoje tem uma “política bastante robusta”, mas ressaltou que esse mesmo nível de segurança ainda não se repete na regulamentação das pilhas de rejeitos.

Apesar da lentidão do processo, alguns atingidos começam a ver melhorias. O agricultor Francisco de Paula Felipe, que se mudou para a nova moradia há dois meses, expressou esperança. “A gente recebeu parte da indenização no começo. Parte está na Justiça ainda para ser resolvida. Não foi fácil a gente viver esses dez anos”, disse ele, com o desejo de ter saúde para criar as duas filhas e vê-las seguir o rumo da vida. Com informações da Agência Brasil

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