Minas Gerais amplia número de doenças diagnosticadas pelo teste do pezinho
“Durante nove anos da minha vida, eu fiquei aguardando por um diagnóstico. Com 14 anos de idade, comecei a apresentar os sintomas da Atrofia Muscular Espinhal, uma doença degenerativa que causa fraqueza e atrofia dos músculos do corpo. Nesse tempo, fui perdendo a musculatura e os movimentos sem saber o porquê. Somente com o sequenciamento genético foi possível obter o diagnóstico da AME e então começar o tratamento”, conta a servidora pública estadual, Caroline Ribeiro, hoje com 28 anos.
“Então, fico muito feliz e emocionada em saber que agora a AME está incluída no teste do pezinho e que todo recém-nascido poderá ser diagnosticado e receber o tratamento logo ao nascer, o que vai garantir um desenvolvimento saudável como o de qualquer outra criança”, comemora ela.
O anúncio da inclusão da AME na ampliação do Programa de Triagem Neonatal (PTN), conhecido como teste do pezinho, foi feito na sexta (26), durante coletiva de imprensa realizada pela Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG), em parceria com o Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad) da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
A iniciativa faz parte do Programa Mineiro de Acessibilidade, Inclusão e Saúde (Promais), lançado pelo Governo de Minas em novembro de 2023 e que é voltado para pessoas com deficiência ou doenças raras.
Início imediato
A partir de 30/1, todas as amostras de crianças que fizerem o exame pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em Minas Gerais, além das outras 12 doenças já triadas, também serão testadas para a AME, a Imunodeficiência Combinada Grave (Scid) e a Agamaglobulinemia (Agama).
O teste é realizado em todas as Unidades Básicas de Saúde (UBS) dos 853 municípios mineiros e o tratamento para as 15 doenças também está disponível na rede pública de saúde estadual.
De acordo com o secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, Fábio Baccheretti, esse passo é de suma importância e vai permitir a otimização do tratamento pelo SUS.
“Com o diagnóstico do teste do pezinho, a nossa expectativa é a de que, em menos de 20 dias, essa criança esteja fazendo sua primeira consulta no ambulatório de doenças raras do Hospital das Clínicas, o que vai proporcionar uma vida de qualidade para esses pacientes. Até então, o diagnóstico vinha só depois da apresentação dos sintomas, o que fazia com que a condução do tratamento fosse diferente do que será oferecido a partir de agora”, apontou.
Avanço
“Esse é um momento muito importante, que merece ser comemorado. Estamos fortalecendo nossa rede com várias ações vinculadas às doenças raras. Não basta ter um diagnóstico precoce, é preciso dar início imediato ao tratamento e fazer o acompanhamento desse bebê por toda a sua vida. E a nossa expectativa é a de que, ainda em 2024, consigamos triar 100% das doenças raras em nosso teste do pezinho ampliado”, anunciou Baccheretti.
As três doenças incluídas são consideradas graves e podem ser hereditárias ou causadas por alterações genéticas, e dificilmente possuem sintomas na fase natal.
Se corretamente diagnosticadas e tratadas nos primeiros dias de vida da criança, a recuperação é certamente efetiva. Da mesma forma, o diagnóstico tardio pode ser fatal e comprometer a qualidade de vida dos pacientes, deixando sequelas irreversíveis.
Para o secretário-chefe da Casa Civil, Marcelo Aro, a ampliação do teste do pezinho é motivo de grande alegria e uma entrega significativa à população mineira. “Diagnóstico é vida, e de qualidade. Estamos falando de uma etapa fundamental, que é triar as crianças no momento certo para oferecer o tratamento no menor tempo possível. Um bebê que começa a ser tratado com 20 dias terá uma vida plena e de qualidade pela frente. Com certeza, o fruto desse trabalho de hoje nós veremos no futuro, com milhares de vidas salvas”, sublinhou.
A diretora da Faculdade de Medicina da UFMG, Alamanda Kfoury, destacou a importância da proximidade e cumplicidade com o Estado de Minas Gerais para com a execução das políticas públicas.
“Quero destacar o papel do Nupad, que completou 30 anos recentemente e foi criado em função do primeiro programa de teste do pezinho. A parceria com o Governo de Minas é estratégica e anunciamos mais este passo com muito orgulho, porque o diagnóstico é muito importante para os pacientes”, salientou.
Investimentos
O Governo de Minas, por meio da SES-MG, vai investir R$12 milhões para o ano de 2024 nesta fase de expansão da triagem. Com isso, a pasta abre caminho para a testagem em massa de crianças para doenças de difícil diagnóstico, uma vez que seus efeitos começam antes da fase clínica de sintomas.
A última ampliação ocorreu em 2021 e incluiu toxoplasmose congênita e mais cinco doenças relacionadas com defeitos da betaoxidação dos ácidos graxos (Doag).
Desde a criação do Nupad, em 1993, foram mais de 7 milhões de crianças triadas. O total de recém-nascidos triados por doença entre 1994 e 2023 pode ser conferido AQUI.
Segundo José Nelio Januário, diretor do Nupad, o material utilizado para realizar a triagem foi importado da Finlândia e dos Estados Unidos e a tecnologia que será utilizada em Minas é semelhante a grandes programas internacionais de triagem.
“Estamos muito orgulhosos de iniciar essa nova etapa de ampliação do teste do pezinho, o que consideramos uma conquista muito importante. Todo o material foi importado e, na Europa, também estão iniciando essa mesma triagem. Esse benefício está sendo propiciado pela SES-MG, que financia esse programa. Isso vai beneficiar cerca de 210 mil crianças por ano, que é o número de amostras que triamos em 2023, por exemplo. Aqui no laboratório processamos cerca de 1,1 mil amostras de crianças todos os dias”, declarou Januário.
Como é o teste?
O exame é feito, geralmente, a partir do sangue coletado do calcanhar do bebê por meio de uma punção local e, por isso, é chamado de “teste do pezinho”. O indicado é que o material seja colhido entre o terceiro e o quinto dia de vida, quando a criança nasce com nove meses (bebê a termo).
Entretanto, essa não é a única forma de coleta. A pediatra Ana Carmen Silva Reis, coordenadora da UTI Neonatal da Maternidade Odete Valadares, da Rede Fhemig, em Belo Horizonte, explica que quando o bebê é prematuro, há outras orientações para a realização do teste.
“O recém-nascido prematuro precisa ter três amostras colhidas. No quinto dia de vida, no décimo dia e 30º dia. As gotinhas de sangue são colocadas no papel filtro e o envelope é encaminhado ao Nupad para processamento. Quando o resultado vem alterado, quer dizer que a criança pode ter alguma daquelas doenças que são graves e, por isso a importância do diagnóstico precoce. Uma vez feito este diagnóstico, é possível prevenir sequelas e até a morte”, destaca.
O resultado fica disponível no site do Nupad e, se apresenta alteração, o município de residência do paciente é acionado. Dessa forma, as consultas e exames especializados são agendados para que seja feita a confirmação do diagnóstico. Caso confirmado, o paciente é encaminhado imediatamente para o tratamento pelo SUS.
Confira as 15 doenças no painel de triagem neonatal do SUS em Minas Gerais:
- hipotireoidismo congênito
- fenilcetonúria
- doença falciforme
- fibrose cística
- deficiência de biotinidase
- hiperplasia adrenal congênita
- toxoplasmose congênita
- atrofia muscular espinhal (AME)
- imunodeficiência combinada grave (SCID)
- agamaglobulinemia (AGAMA)
- deficiência de acil-CoA desidrogenase de cadeia muito longa (VLCADD)
- deficiência de acil-CoA desidrogenase de cadeia longa (LCADD)
- deficiência de proteína trifuncional – DPTC
- deficiência primária de carnitina – DPC
- deficiência de acil-CoA desidrogenase de cadeia média (MCADD)
Entre as possibilidades de tratamento para as três doenças incluídas no PTN-MG estão o transplante de medula óssea, o uso de imunoglobulina humana endovenosa e medicamentos que impedem a degeneração neuronal.
Atendimento humanizado
Os bebês que nascem prematuros e necessitam de internação no CTI Neonatal realizam o teste na maternidade, durante o período de internação.
Para garantir que sejam atendidos com cuidados mais humanizados, existe protocolo no SUS para minimizar os incômodos e garantir a coleta correta.
De acordo com Cinthia Andrade Ferreira, enfermeira da Maternidade Odete Valadares, o mais importante é garantir que o bebê fique confortável e tranquilo durante a realização dos testes.
“No CTI Neonatal o teste do pezinho é realizado de forma diferente. Utilizamos um escalpe, algodão com álcool, algodão seco e o filtro de coleta das gotas para o teste. É oferecido para o recém-nascido um protocolo de dor dois minutos antes do procedimento. Aqui, todo procedimento é feito a quatro mãos, com dois profissionais, para que esse bebê tenha o maior conforto possível. Aquecemos o membro escolhido para a coleta para facilitar o fluxo de sangue e o bebê é contido por um dos profissionais de enfermagem, para se sentir seguro, enquanto o outro realiza o teste”, explica a profissional. Com Agência Minas