Idec aponta que bancos brasileiros tiraram nota 3 em práticas para combater mudanças climáticas
A avaliação dos documentos públicos dos maiores bancos brasileiros em temas socioambientais e climáticos, revela que essas instituições deixam de aplicar diretrizes importantes relacionadas, por exemplo, ao combate às mudanças climáticas, tanto em suas próprias operações quanto na concessão de crédito e nos seus investimentos. Neste ano, a nota média dos bancos neste tópico, em um ranking que vai de 0 a 10, ficou em 3. Levando-se em conta os 18 temas avaliados, a média foi 3,3, ou seja, os bancos cumprem apenas 33% do que a metodologia prevê, destacando a insuficiência das ações implementadas pelas instituições até o momento.
Esses são alguns dos resultados da décima edição do Guia dos Bancos Responsáveis, publicação bianual divulgada neste mês de novembro. O projeto é coordenado pelo Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), em parceria com Conectas Direitos Humanos, Instituto Sou da Paz, Oxfam Brasil e Proteção Animal Mundial. Foram avaliados os oito maiores bancos que operam no país, e que, juntos, concentram 71,7% dos ativos do sistema bancário: Banco do Brasil, BNDES, Bradesco, BTG Pactual, Caixa Econômica Federal, Itaú Unibanco, Safra e Santander Brasil.
Mudanças climáticas
No Guia dos Bancos Responsáveis, o tema de mudanças climáticas avalia a pegada de carbono das instituições financeiras e a capacidade de seus portfólios se adequarem ao cenário de 1,5°C, conforme acordado internacionalmente. Também analisa as estratégias de transição para uma economia de baixo carbono, incluindo a substituição de combustíveis fósseis por fontes de energia renováveis. Além disso, o tema examina se os bancos incentivam as empresas nas quais investem e financiam a medir, divulgar e reduzir suas emissões, e sua capacidade de eliminar gradualmente o financiamento e os investimentos em atividades com emissões de GEE inaceitavelmente altas.
A emergência climática é um assunto urgente e que ameaça todas as formas de vida. Ainda assim, até hoje os bancos Safra e BTG não instituíram metas de redução de emissões próprias em conformidade com o limite de aumento da temperatura global em 1.5ºC. Além disso, não fazem a publicação do inventário das emissões de gases do efeito estufa de suas carteiras de crédito e investimento. Somado a tudo isso, tanto esses dois bancos quanto a Caixa Federal, não possuem estratégias de phase-out, ou seja, de desinvestimento, para a mineração, exploração de carvão mineral, térmico, petróleo e gás.
Banco do Brasil, BNDES, Bradesco, Itaú e Santander apresentam políticas de exclusão e estratégias de phase out gradual de financiamentos a projetos e empresas que fazem mineração, exploração e desenvolvimento de minas de carvão mineral, térmico, energia gerada a carvão, extração de petróleo e gás não convencional.
A maior parte dos bancos avaliados aplicam essas políticas apenas para seus financiamentos, com exceção do Banco do Brasil e do Itaú, que aplicam políticas restritivas para seus investimentos próprios no setor de carvão mineral e térmico.
Além disso, quase todos os bancos não disponibilizam informações sobre as suas emissões absolutas de gases do efeito estufa de escopo 1, 2 e 3, associadas a todo o seu portfólio de financiamento e investimento. Sem este tipo de informação, fica ainda mais difícil enfrentar o problema.
As instituições financeiras também negligenciam compromissos de desinvestimento em setores críticos, como na exploração de óleo e gás.
Outro ponto que merece atenção é a ausência de salvaguardas climáticas em relação à gestão de ativos próprios e de terceiros. Se para as políticas de crédito e financiamento de projetos encontra-se um ou outro compromisso relacionado ao enfrentamento das mudanças climáticas, quando volta-se para as carteiras de investimento, esses mesmos compromissos são praticamente inexistentes.
“Antes de decidir investir dinheiro em determinado projeto, o banco tem a obrigação de fazer uma avaliação rigorosa dos riscos que aquele financiamento representa para as pessoas e para a natureza que podem ser afetadas por ele – e não para o investimento em si. No caso hipótetico de financiamento para uma empresa de carne que cria gado em área desmatada ou com mão de obra em condições análogas à escravidão, o banco deve responder por essas violações na mesma medida em que a empresa financiada por ele, já que ambos tiraram proveito da atividade”, explica Julia Catão Dias, coordenadora do programa de Consumo Sustentável do Idec
A que conclusões pode-se chegar?
A edição de 2024 do Guia dos Bancos Responsáveis destaca a necessidade de um compromisso renovado e efetivo das instituições financeiras brasileiras com as questões socioambientais e climáticas. O cenário atual geral indica um distanciamento preocupante em relação às expectativas da sociedade civil e às urgências impostas pela emergência climática e demais crises socioambientais que enfrentamos, apontando para a necessidade da incorporação de compromissos e diretrizes mais rigorosas por parte dos bancos.
É essencial que os bancos incorporem em suas políticas critérios rigorosos em matéria socioambiental e climática e, mais do que isso, que apliquem, na prática, medidas efetivas para prevenir, mitigar e reparar as violações de direitos fruto das atividades das empresas que financiam ou nas quais investem.
Embora tanto as políticas de crédito quanto as de financiamento de projetos apresentem fragilidades, o cenário é ainda mais preocupante nas carteiras de investimento, que possuem pouquíssimas diretrizes. Enquanto os compromissos em relação ao crédito tendem a ser mais rigorosos, as carteiras de investimento carecem de políticas robustas, tornando sua gestão consideravelmente mais negligente.
Metodologia
O Guia dos Bancos Responsáveis aplica a metodologia desenvolvida pela rede da Fair Finance International e pela Profundo, uma consultoria de sustentabilidade sediada nos Países Baixos. As instituições financeiras também são convidadas e incentivadas a contribuir com o seu aprimoramento.
São analisados os compromissos públicos assumidos pelas instituições financeiras em relação à 18 temas, divididos em três categorias:
Temas transversais: bem-estar animal; mudanças climáticas; corrupção; igualdade de gênero; direitos humanos; direitos trabalhistas; meio ambiente; impostos
Temas setoriais: armas; alimentos; florestas; mineração; óleo e gás; geração de energia
Temas operacionais: proteção ao consumidor; inclusão financeira; remuneração; transparência e prestação de contas
Cada tema possui diretrizes que as instituições financeiras devem deixar explícitas em suas políticas e pergunta-se ao banco se elas estão presentes em algum dos seus documentos públicos. Se a resposta for sim, o banco pontua. Senão, a nota é zero.
Essa avaliação é feita não só em relação à operação interna do banco, mas também para quatro categorias de serviços financeiros: os créditos corporativos, o financiamento de projetos, a gestão de recursos próprios e a gestão de recursos de terceiros.
Quanto mais abrangente for o compromisso assumido pelo banco, maior a nota naquele elemento, e, consequentemente, naquele tema. informações são da Assessoria de Comunicação do Instituto de Defesa de Consumidores.