Tamanho efetivo do rebanho da raça bovina Crioula Lageana é garantido em bancos genéticos

Uma pesquisa da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF) acordou touros da raça bovina Crioula Lageana para serem doadores de sêmen, a fim de garantir a conservação da variabilidade genética desses animais em bancos de germoplasma. O tamanho efetivo da população encontrada nesse estudo foi de 21 animais que, embora esteja abaixo do recomendado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, na sigla em inglês) para garantir que não haja risco de extinção, é considerado bom por se trata de uma raça de pequena população (aproximadamente 1.500 indivíduos no Brasil).

A estimativa de tamanho efetivo representa quantos reprodutores não aparentes, tanto machos quanto fêmeas, estão efetivamente participando dos cruzamentos e contribuindo geneticamente para uma população. Ou seja, embora o rebanho total da raça Crioulo Lageano tenha aproximadamente 1.500 animais, estima-se que um total de 21 animais não aparentados desenvolvidos para a formação de rebanhos.

De acordo com a FAO, a sobrevivência de uma raça ao longo do tempo é garantida com um tamanho efetivo de rebanhos em cerca de 50 animais. No caso do gado Nelore, por exemplo, que tem milhões de cabeças em todo o mundo, diferentes estudos estimam que o tamanho efetivo do rebanho é em cerca de 100 animais, segundo a pesquisadora da Embrapa Patrícia Ianella.

“Essas raças localmente adaptadas, como a Crioula Lageana, o número de animais normalmente é muito pequeno e, portanto, a população efetiva é ainda menor”, ​​explica o pesquisador. No estudo, a Embrapa analisou 450 animais registrados, de oito fazendas, com o objetivo de avaliar a variabilidade genética dos rebanhos e orientar cruzamentos nas diferentes propriedades, em parceria com a Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Crioula Lageana ( ABCL ).

Avanço
Para o Programa de Conservação e Uso de Recursos Genéticos Animais da Embrapa , do qual a Crioula Lageana faz parte, o trabalho em parceria com a ABCCL foi um avanço. “O tamanho específico do material dessa raça que temos guardado em nosso Banco Genético é de 10 animais. Com o estudo realizado, conseguiremos aumentar o nosso tamanho efetivo para 21, a partir da coleta de alguns touros-chave dos rebanhos das fazendas participantes”, destaca Ianella.

Alguns materiais já estão sendo eliminados, mas outros ainda dependem da disponibilidade dos produtores para levar os animais para uma central de coleta, por exemplo. Ianella acredita que esse trabalho de atualização do Banco Genético deve estar concluído em, no máximo, cinco anos.

Seleção e melhoramento irão beneficiar os produtores
Mas o trabalho vai além das análises genéticas realizadas pela equipe da Embrapa. Ele começou quando a ABCCL encontrou o pesquisador Alexandre Floriani , que já auxiliava a associação, para elaborar um projeto que ajudasse os criadores a organizar o manejo genético da raça e a realizar a seleção e o melhoramento genético. “No caso de um rebanho pequeno, existe a possibilidade de se perder variabilidade durante esse percurso. Por isso eles nos procuraram, para garantir que isso não aconteça”, afirma Floriani.

Essa análise permitirá, por exemplo, orientar os cruzamentos para evitar a endogamia (cruzamento entre parentes), maximizar a variabilidade e selecionar características para melhorar a produtividade da raça. Para minimizar o risco de extinção, a Embrapa e a ABCCL buscaram por criadores que não estão associados, para trazê-los para o programa. “Com isso, a gente pode identificar uma maior variabilidade e aumentar esse tamanho populacional efetivo”, esclarece.

De acordo com o pesquisador, o trabalho de melhoramento genético deve resultar em animais com melhor desempenho ponderal (ganho de peso) e qualidade de carcaça e da carne, sem perder as características adaptativas que a raça alcançada por meio da seleção natural, como maior tolerância térmica e resistência a parasitas e algumas doenças.

“Atualmente, também estamos desenvolvendo um trabalho de uso do Crioulo Lageano em cruzamentos com animais nelores na região do Matopiba”, comenta Floriani, explicando que esse estudo tem o objetivo de produzir carne premium, de forma sustentável, em região de clima tropical.

Pesquisa foi publicada em artigo científico
O resultado da análise genética da raça Crioula Lageana foi descrito em um artigo científico publicado recentemente, tendo como autor principal a aluna de mestrado Daiza Orth, do programa de Pós-Graduação em Ciências Animais da Universidade de Brasília ( UnB) .

Assinam como coautores Lucas Macedo Santos Basílio, também do programa de pós-graduação da UnB; Alexandre Floriani Ramos, Alexandre Rodrigues Caetano (orientador da aluna) e Patrícia Ianella, da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia; e Geraldo Magela Cortes Carvalho , da Embrapa Meio-Norte (PI).

Intitulado Caracterização genômica do Crioulo Lageano brasileiro: insights para a conservação de uma raça bovina local brasileira (Caracterização genômica do Crioulo Lageano brasileiro: insights para a conservação de uma raça bovina local brasileira), o artigo pode ser conferido, na íntegra , aqui .

Patrícia Ianella ressalta que esse estudo trouxe outra novidade para o Programa de Conservação e Uso de Recursos Genéticos Animais da Embrapa. “Até então, recebemos apenas os materiais que nos foram oferecidos. No caso desse trabalho, adotamos uma postura ativa, escolhendo os animais dos quais queremos preservar material em nosso banco.”

Ela ressalta que esse fator é fundamental para a melhoria do processo de conservação periódica no Banco Genético da Empresa. “Ter muito material, mas sem variabilidade, não é o nosso foco. O ideal é conseguir representar a variabilidade da raça com o menor número de amostras possíveis”, afirma.

Criopreservação para garantir a diversidade
O rebanho Crioulo Lageano no Brasil é estimado em, aproximadamente, 1.500 cabeças. Por ser pequeno, existe a possibilidade de perda de variabilidade em razão de cruzamentos endogâmicos e com raças comerciais, como Nelores e outras consideradas mais produtivas. “O que nós percebemos com esse trabalho é que os criadores fazem um grande esforço para manter a raça, pela importância histórica e cultural, além das características adaptativas à região que ela tem”, diz Floriani.

Segundo ele, os acasalamentos entre parentes dentro da mesma população são relativamente baixos na Crioula Lageana quando se compara a outros bovinos, e a variabilidade é relativamente alta em comparação a outras raças mantidas com restrições menores.

Mesmo assim, conforme explica o pesquisador, quando se faz um trabalho de seleção e aprimoramento, como o que a ABCCL está fazendo com o apoio da Embrapa, sempre há o risco de se perder variabilidade. “Por isso, além de orientar para que não sejam feitos cruzamentos inadequados, estamos atualizando nosso Banco Genético por meio da criopreservação de esperma e embriões para garantir a preservação da diversidade da raça”, comenta.

Uma raça colonial
O Crioulo Lageano é originário, provavelmente, dos antigos bovinos Hamíticos, caracterizados por chifres longos, introduzidos no sul da Espanha, provenientes da África do Norte. Trazida ao Brasil no período da colonização por portugueses e espanhóis, uma raça se adaptou aos campos nativos de Santa Catarina e do Paraná, num processo de seleção natural que já dura séculos. Essa adaptação resultou em uma enorme rusticidade, traduzida em resistência às baixas temperaturas registradas naquela região, que está entre as mais frias do País.

Mas, segundo Floriani, estudos realizados pela Embrapa apontaram que, além da adaptação ao frio, o Crioulo Lageano se mostrou tolerante a temperaturas mais elevadas, de forma semelhante a outros taurinos brasileiros – como o Curraleiro Pé-Duro e o Pantaneiro – e ao Nelore.

É uma raça bovina que tem os maiores chifres já registrados no Brasil: cerca de 2 metros, de ponta a ponta, na variedade aspada. São animais de grande porte, produtores de carne e também apresentam boa leiteira, o que faz com que as mães tenham uma excelente habilidade materna. Apesar de todos esses aspectos positivos, o Crioulo Lageano provavelmente já estaria extinto se não fosse pelo trabalho de uma família de criadores de gado de Santa Catarina, a família Camargo, que sempre acreditou no valor genético desses animais.

Na década de 1980, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia incluiu a raça no seu Programa de Conservação e Uso de Recursos Genéticos Animais e passou a desenvolver estudos genéticos com os exemplares da fazenda do senhor Antônio Camargo, ou seu Antoninho, como era mais conhecido, hoje já falecido.

Em 2004, um passo importante foi dado para o reconhecimento do valor genético desses rebanhos com a fundação da Associação Brasileira de Criadores de Bovinos da Raça Crioula Lageana (ABCCL). Essa ação foi resultado da iniciativa de 16 pecuaristas da Região Sul, sendo a maior parte de Santa Catarina, um do Rio Grande do Sul e um do Paraná.

Em outubro de 2008, a Crioula Lageana foi reconhecida como raça pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), um passo importante para afastá-la do perigo de extinção. Com informações da Embrapa.

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