Reajuste de medicamentos pode ser muito maior do que o anunciado pelo governo, alerta nova pesquisa do Idec
O Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) divulgou nesta segunda-feira (1º) seu novo levantamento sobre os preços de medicamentos. O estudo, que também foi realizado em anos anteriores, revela mais uma vez que, na prática, os aumentos de preços dos remédios nas farmácias podem ser muito maiores do que o autorizado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (Cmed), órgão do governo federal responsável por limitar e fiscalizar preços de medicamentos no Brasil.
Nesta segunda-feira (1º de abril), entra em vigor o novo reajuste ao Preço Máximo ao Consumidor (PMC), que é o valor máximo que uma farmácia pode cobrar por cada medicamento. O índice divulgado na última sexta-feira (29), e que começa a valer a partir de agora, foi de 4,5%, próximo à inflação acumulada em 2023. Contudo, diferentemente do que os anúncios dão a entender, a aplicação desse índice recairá apenas sobre o PMC, mas não necessariamente sobre o preço cobrado nas farmácias.
Esse fenômeno acontece porque, conforme demonstra a pesquisa, os preços médios cobrados em grandes redes de farmácia são muito inferiores ao preço teto da Cmed. Um remédio comum, como a losartana potássica, chega a custar, na farmácia, menos de um quarto do seu preço máximo. Isso significa que, na prática, a farmácia poderia reajustar este remédio em mais de 300%, sem desrespeitar o reajuste de 4,5% sobre o PMC.
“Essa pesquisa já foi feita em anos anteriores e o mesmo problema é reproduzido: o PMC, que é o teto de preços de cada medicamento, está em um valor muito acima do praticado pelo mercado e não cumpre a sua função de impedir aumentos abusivos. Vamos pegar outro exemplo, como uma marca de Amoxicilina + Clavulanato de Potássio, um tipo de antibiótico. Apesar de o preço máximo dele ser de R$ 404,65, ele é encontrado nas farmácias, em média, por R$ 180,30. Mas o valor aplicado pelo reajuste vai ser sobre o preço máximo. Então, se a fabricante e as farmácias mais que dobrarem o preço desse remédio de um dia para o outro, o consumidor não poderá recorrer a ninguém”, explica a pesquisadora do programa de Saúde do Idec Marina Magalhães, uma das responsáveis pelo levantamento. “Se a função do limite de reajuste do teto de preços é impedir aumentos exagerados, ele falha totalmente”, completa.
A pesquisa realizada pelo Idec coletou os preços dos medicamentos nas três maiores redes de farmácia do Brasil, analisando medicamentos com 20 princípios ativos diferentes, de marcas selecionadas a partir de critérios de prevalência no mercado, além de suas versões genéricas. O estudo também buscou saber a diferença entre os preços máximos dos medicamentos e o valor praticado com descontos, mediante a concessão para as farmácias de dados pessoais dos consumidores, como o número do CPF.
O levantamento revela que, entre os medicamentos de marca, mesmo antes da aplicação de qualquer desconto, a diferença média entre valores praticados e o preço máximo na regulação foi de 37,82%. Em valores absolutos, a maior diferença encontrada foi de R$ 224,35, no caso do medicamento Clavulin. Já a diferença média entre o preço máximo dos medicamentos genéricos sem desconto e aqueles encontrados nas farmácias foi de 20,89%, chegando a uma diferença máxima, em valores absolutos, de R$ 65,94, no caso do aciclovir.
Com CPF
Quando considerados os descontos concedidos pelo fornecimento de CPF, a diferença entre a média de mercado e os preços máximos é ainda maior. Entre os medicamentos de marca, a diferença média em relação ao PMC quase dobrou, passando de 37,82% para 71,63%.
Nesta mesma comparação, entre os genéricos, essa diferença mais que quintuplicou, indo de 20,89% a 115,52%.
Essa grande diferença de preços levanta uma suspeita de discricionariedade na fixação dos descontos relacionados ao CPF. Os altíssimos preços-teto permitem, na prática, que varejistas estabeleçam preços inflacionados para coagir o consumidor a fornecer seus dados em troca de um desconto possivelmente artificial.
Recomendações
Para o Idec, os resultados reforçam a necessidade de uma nova regulação do mercado. “Diferenças desta amplitude sugerem um descolamento muito significativo entre a regulação e as práticas de mercado, o que diminui sua efetividade e limita o cumprimento de seu objetivo. Quem será mais afetado é aquele consumidor que está mais vulnerável por conta de um problema de saúde e necessita daquele remédio essencial para sua vida”, reforça Magalhães.
O estudo também apresenta recomendações para que distorções tão grandes sejam evitadas. Para o Idec, a regulação precisa ser modernizada para garantir maior transparência sobre os custos de produção e venda dos medicamentos; critérios de precificação mais adequados aos custos e à realidade nacional; prerrogativa da Cmed para adequar preços à realidade de mercado, harmonização da regulação; e participação social no processo de precificação de medicamentos.
Todas essas propostas estão incluídas na Campanha Remédio a Preço Justo, que apoia a aprovação do Projeto de Lei 5591/20. Esse projeto altera as regras para a definição dos preços de novos medicamentos no mercado brasileiro e impõe novos requisitos de transparência para as empresas do setor. O PL, que está sob relatoria do senador Ciro Nogueira, está parado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, sem nenhum avanço há quase um ano. Com informações da Assessoria de Comunicação do Instituto de Defesa de Consumidores.