Revolução na detecção de milho transgênico: tecnologia combinada oferece agilidade e precisão
Uma metodologia inovadora, desenvolvida por pesquisadores da Embrapa em colaboração com quatro universidades brasileiras e um instituto italiano, promete transformar a identificação de grãos de milho transgênico. A técnica, que combina a espectroscopia de plasma induzida por laser (LIBS) com algoritmos de aprendizado de máquina, demonstrou ser capaz de distinguir variedades de milho geneticamente modificadas de forma precisa, rápida e acessível.
Atualmente, a detecção e quantificação de alimentos e rações geneticamente modificados são realizadas por meio do teste padrão baseado na Reação em Cadeia da Polimerase (PCR), que identifica e quantifica a presença de proteínas específicas de DNA na amostra. Embora seja um método preciso e sensível, o PCR é conhecido por ser demorado e de alto custo.
Nas últimas décadas, a produção e o consumo de produtos agrícolas geneticamente modificados aumentaram significativamente em todo o mundo, impulsionados pelo crescimento populacional e pela crescente demanda por alimentos. Paralelamente, cresceu a necessidade de métodos ágeis e econômicos para identificar e diferenciar produtos modificados geneticamente (cujo DNA foi alterado por engenharia genética) e não modificados nos setores de controle e comercialização de alimentos.
Metodologia validada e o papel do aprendizado de máquina
O estudo foi parte da tese de doutorado de Matheus Cicero Ribeiro, orientado pelo professor Bruno Marangoni no Programa de Pós-Graduação em Ciência dos Materiais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Na Embrapa Instrumentação (SP), os experimentos foram acompanhados pela coordenadora do Laboratório Nacional de Agrofotônica (Lanaf), a pesquisadora Débora Milori.
“A principal inovação da nossa pesquisa reside na combinação da técnica LIBS com análises multivariadas e aprendizado de máquina (Machine Learning), na qual as informações elementares das amostras foram avaliadas e utilizadas para construir critérios de decisão que diferenciam as amostras transgênicas das não-transgênicas”, afirma Ribeiro.
Segundo ele, o trabalho demonstrou que a combinação de técnicas consegue diferenciar distintas variedades de milho, tanto geneticamente modificadas quanto convencionais, mesmo que apresentem composição elementar similar. “Elas oferecem vantagens essenciais, como baixo custo, resposta rápida, sensibilidade razoável e fácil aplicação”, complementa.
O principal desafio da pesquisa envolveu a identificação dos constituintes elementares, como carbono (C), nitrogênio (N), magnésio (Mg), potássio (K), hidrogênio (H), ferro (Fe) e sódio (Na). Dentre esses, o carbono apresentou maior influência na diferenciação entre as classes transgênica e não-transgênica do milho.
“Como as amostras apresentavam composição elementar muito similar, ou seja, os mesmos elementos, identificar marcadores específicos de cada classe foi um processo minucioso que consumiu muito tempo de análise. Dessa maneira, houve a necessidade da combinação das análises multivariadas com o aprendizado de máquina, momento em que o computador conseguiu identificar marcadores que foram capazes de diferenciar as amostras no processo de classificação”, explicou Ribeiro.
Outro diferencial do estudo foi a avaliação de uma quantidade significativa de amostras: 160 no total, provenientes de seis espécies de milho, sendo quatro transgênicas e duas convencionais. Ribeiro relata que esta é a primeira vez que um protocolo de validação externa foi testado para a classificação de milho transgênico utilizando LIBS. “A validação externa corroborou a robustez do modelo”, afirma.

Impactos diretos na segurança alimentar e no agronegócio
“Esse método oferece uma solução eficaz para monitoramento e rastreabilidade no setor agrícola, atendendo às exigências de regulamentação e segurança alimentar e garantindo conformidade com políticas nacionais e internacionais”, reforça o professor Bruno Marangoni ao ressaltar que a metodologia identifica a origem da amostra de forma ágil e acessível.
A técnica pode ser empregada por laboratórios de análise de alimentos, centros de controle de qualidade, indústrias agroalimentares e órgãos reguladores. Além disso, empresas agrícolas e de biotecnologia também podem utilizar a tecnologia para monitorar e certificar a origem de suas produções. Segundo Marangoni, autoridades de vigilância sanitária, nacionais e internacionais, podem aplicá-la para fiscalizar produtos alimentícios, assegurando a proteção do consumidor e a conformidade com as normas vigentes.
“Com testes ágeis sobre a origem dos produtos, seria possível ampliar o número de itens analisados, resultando em maior segurança e transparência no mercado. Essa tecnologia também aumentaria a confiança na cadeia de suprimentos alimentares, permitindo que os consumidores façam escolhas informadas sobre o que compram e consomem”, afirma o professor.
Próximos passos: testes em larga escala e padronização
O próximo passo da pesquisa visa a expansão da base de dados, incluindo um número maior de amostras de diferentes localidades para aprimorar o algoritmo de aprendizado de máquina, aumentando sua robustez e confiabilidade.
“Em seguida, é importante explorar formas de tornar a metodologia mais acessível e aplicável em larga escala, como a criação de dispositivos portáteis para testes em campo. A padronização do método também é essencial, facilitando sua validação e aceitação por diferentes reguladores e permitindo que ele seja integrado aos processos de controle de qualidade e certificação de transgênicos”, diz Marangoni.
O milho e a relevância dos transgênicos no Brasil
O milho é um dos alimentos mais disseminados e essenciais do mundo, amplamente consumido por humanos e animais. De acordo com Ribeiro, o milho é a cultura que apresenta a maior quantidade de eventos transgênicos entre as geneticamente modificadas. Isso significa que diferentes genes são inseridos no DNA da planta para conferir resistência a efeitos adversos que podem comprometer seu crescimento e produção. Segundo a Embrapa, 90% de todo o milho cultivado no Brasil é transgênico.
Milori, que trabalha com a técnica LIBS há cerca de 20 anos, destaca que, nos últimos anos, a espectroscopia de emissão com plasma induzida por laser (LIBS) tem atraído grande interesse da comunidade científica por sua capacidade de fornecer rapidamente informações qualitativas e quantitativas sobre a composição elementar de diversos materiais.
“Além disso, o LIBS combinado com métodos quimiométricos e de aprendizado de máquina aumentou consideravelmente o desempenho na identificação e discriminação bem-sucedidas de amostras”, relata a pesquisadora. Ela acrescenta que a LIBS é uma técnica analítica popular, com pesquisas e aplicações práticas em diversas áreas, incluindo o setor agrícola. “A técnica também é particularmente atraente devido à disponibilidade de instrumentos portáteis que permitem análises LIBS in situ e on-line”, informa.
O estudo “Discrimination of maize transgenic and non-transgenic varieties by laser induced spectroscopy (LIBS) and machine learning algorithms”, publicado pelo Microchemical Journal, foi apoiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Com informações da Embrapa


